Skip to content

Sociologia do século vinte

Aspectos do conhecimento na realidade social.

  • La estratificación social en entornos capitalistas
  • As Relações Humanas e a insuficiência de sua Psicologia Social
  • A Sociologia na Desconstrução das Desigualdades Sociais
  • Dois Estudos Sobre as Desigualdades Sociais
  • Obras de Jacob (J.) Lumier
  • Home Page
  • Download obras del autor Jacob J. Lumier
  • Introdução à Sociologia: Textos para Leitura e Debate
    • Ensino Crítico de Sociologia
      • O Mundo Dos Valores e as Condutas Efervescentes
      • Suporte para o ensino crítico de sociologia.‎
        • Perfil de Saint-Simon – 2
        • O CONFORMISMO COMO OBSTÁCULO: perfil de Saint-Simon -3
      • Seria Durkheim Altermundialista?
      • O Sistema Cognitivo do Capitalismo
        • A Presença Da Classe Burguesa No Saber
      • A sociologia dos agrupamentos particulares
        • O problema da possibilidade da estrutura
          • Pluralismo Descontinuista e Desdogmatização
        • O Esquema de Análise Diferencial em Microssociologia
        • Crítica aos Paradigmas de Localização
    • Sobre Georges Gurvitch
      • Análisis crítico del sociologismo de Durkheim
    • La méthode d’Henri Lefebvre
    • A revolução do empirismo na base da atitude científica
      • Sobre a tentativa frustrada de Popper em refutar Heisenberg
    • Efetivismo na Teoria Sociológica: nova versão
  • El Problema Sociológico de la Consciência Coletiva
    • A Psicologia Coletiva Na Sociologia: Preliminares
      • El análisis sociológico de la comunicación social en función de la psicología colectiva
      • La sociología de la vida psíquica delante del problema de la comunicación social: Una Introducción
    • Os níveis da consciência alienada
    • Subjetividad Colectiva y Dialéctica
    • Variabilidade ou Imposição ?
      • Conhecimento e Sociologia: Um tópico
      • Microssociologia, Gabriel Tarde, Durkheim
      • Crítica da aplicação do paradigma de Hobbes em Teoria sociológica.
        • Dialética e Ambiguidade: notas sobre indivíduo e sociedade
      • Sociologia do Conhecimento: o saber como regulamentação social
        • Sociologia do conhecimento: notas para uma introdução
        • A Sociologia dos Sistemas Cognitivos (Apresentação, Sumário e Introdução do livro)
      • O trabalho intelectual como objeto da condição humana (Um tópico de sociologia do conhecimento)
        • A Utopia do Saber Desencarnado, a Crítica da Ideologia e a Sociologia do Conhecimento.
  • New: Direitos Humanos e Compartilhamento
    • Responsabilidade dos indivíduos e ONGs na promoção e proteção dos direitos humanos
      • Nota sobre el problema del posicionamiento de los afrodescendientes en relación a la discriminación y los prejuicios raciales
    • Informe del Alto Comisionado de las Naciones Unidas para los Derechos Humanos
    • Derechos humanos: Diferencia y complementariedad entre el sociológico y el jurídico
    • Os direitos humanos como mentalidade
      • Sociologia para a Mentalidade dos Direitos Humanos: Apresentação
        • A Convivência de Direitos sob análise sociológica
        • Direitos humanos, Participação e Tecnologias (TICs)
        • A aplicação da sociologia do conhecimento na crítica aos efeitos subordinantes da tecnificação do saber
    • Entraves ideológicos para a aproximação de sociologia e direitos humanos.
    • Las bases sociológicas de la positivación de los derechos humanos: Presentación
    • El sociológico y el Jurídico en el enseño de los derechos humanos – Versión apostilla
    • Os Estados, os líderes e os direitos humanos hoje
      • The international counter-offensive of human rights
      • Enseño interdisciplinar de los derechos humanos.
      • DIREITOS HUMANOS > CAMPANHA MUNDIAL: Reação contra a xenofobia e o racismo
    • Más oscuro y más peligroso: derechos humanos en 40 países
  • Child page
    • Leituras do Século XX
  • 1. Home Page
  • La sociología de la vida psíquica delante del problema de la comunicación social: Una Introducción
    • Psiquismo Colectivo y Hechos Sociales  
    • A crítica aos preconceitos filosóficos e sua implicação na teoria sociológica
      • A crítica aos preconceitos filosóficos – Parte 02
      • A experiência da laicização na sociologia de Marx
      • El análisis sociológico de la comunicación social en función de la psicología colectiva
      • A Tecnificação e o imaginário psicologista do individualismo
      • Gestalttheorie e Sociologia
    • O Problema Da Identificação Heteropática No Estudo Da Consciência Coletiva
    • Haverá uma ordem geral da sociabilidade? Observações sociológicas sobre coesão e mobilidade.
  • About
    • Download obras del autor Jacob J. Lumier
    • Obras de Jacob (J.) Lumier
    • A Sociologia na Desconstrução das Desigualdades Sociais
    • Apresentação do e-book: Entraves Ideológicos …
    • A Ideia Tridimensional Em Sociologia
    • Cultura e Consciência coletiva-2
  • Contact
  • Blog

formação

A experiência da laicização na sociologia de Marx

Posted on August 27, 2017March 12, 2018 by Jacob (J.) Lumier

 

 

A experiência da laicização na crítica da consciência alienada: observações sobre a distância cognitiva de Marx em face do fetichismo da mercadoria.

Acesse free a versão atualizada deste artigo no livro:

 

Sumário

Introdução.. 1

Os símbolos sociais e o conhecimento.. 1

Marx e o fetichismo da mercadoria.. 1

A liberdade libertadora no mundo da produção.. 1

A experiência da laicização na crítica da consciência alienada.. 1

Práxis social e dialética.. 1

Marx e as suas duas revoltas na conceituação.. 1

Humanismo e sociologia em Marx.. 1

Práxis e sociologia.. 1

Graus de prometeísmo.. 1

A laicização como fator de relativização do arcaico e do histórico   1

 

Introdução

 

É sabido que a dialética desdogmatizadora de Marx se elabora em revolta contra Hegel e contra a análise hegeliana da realidade social resumida por este na “Filosofia do Direito” (1820, Principes de la philosophie du droit, trad. André Kaan, Gallimard, 1940) e passada em crítica pelo jovem Marx na Introdução da Contribuição à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel (1843), ainda que seja notada certa condescendência deste para com “A Fenomenologia do Espírito” [i].

Sem dúvida, o aproveitamento da sociologia de Marx resta metodologicamente ancorado nessa “revolta” fundante, nessa negação do discursivo viabilizando o conhecimento em realidade, cuja procedência é tanto mais confirmada quanto patente se mostra o fracasso de Hegel na sua tentativa de ligar dialética e experiência, ligação fundamental para as Ciências Humanas [ii].

Como já fora assinalada pelos sociólogos, a dialética de Marx encontra-se nas antípodas da dialética de Hegel porque não defende uma tese filosófica pré-concebida, mas busca pôr em relevo a complexidade e o caráter dramático da realidade social e a relatividade dos diferentes quadros sociais em que decorre a vida econômica. Além disso, a dialética de Marx levanta um problema novo que Hegel não considerou nem poderia ter considerado: o da relação dialética entre método dialético e a realidade social e, sobretudo, a realidade humana, que já é dialética [iii].

 

Os símbolos sociais e o conhecimento

 

Marx foi sociólogo no sentido estrito de reconhecer o fenômeno humano da laicização.

 

Com efeito, a laicização é uma dimensão permanente da experiência humana que se redescobre a partir do problema do conhecimento nas sociedades modernas. É implicada no desencantamento do mundo à medida que este, por sua vez, traz consigo a generalização da moralidade de aspiração, como expressão da tomada de consciência da imperfeição do mundo, estudada como se sabe no âmbito da sociologia por Max Weber [iv] em paralelo com a descrença dos mitos das religiões históricas – a desmitologização. Neste sentido, falar de laicização é pôr em relevo a desdogmatização do saber.

Trata-se, portanto, de uma dimensão humana com relevância específica para a sociologia. A permanência da laicização como fato social põe em descoberto a impossibilidade em opor o histórico e o arcaico. Daí a compreensão de que, nas sociedades históricas, o saber é inseparável das mitologias, de tal sorte que os mitos e os símbolos sociais são intermediários positivos do conhecimento.

A laicização constante dos simbolismos sociais é uma via permanente para o saber renovado.

Com efeito, a laicização acontece quando deixamos de temer ou recear as forças que Nós-outros mesmos criamos. Vale dizer, é preciso assumir e afirmar o ponto de vista microssociológico dos Nós-outros humanos para pôr em relevo a laicização, como experiência humana irredutível no desenvolvimento da produção material e das atividades práticas, viabilizando a afirmação irreversível do Homo Faber [v].

Tema crítico, a laicização adquiriu procedência nos meios científicos a partir das análises de sociologia econômica desenvolvidas por Karl Marx em torno à crítica da Economia Política, com a descoberta da realidade social por trás do fenômeno do fetichismo da mercadoria no capitalismo, que muitos sociólogos da literatura e críticos da cultura estudam sob a rubrica da reificação [vi].

 

Marx e o fetichismo da mercadoria

 

Se à primeira vista a referência à laicização como foco do conceito sociológico de mudança social permanente e como experiência fundante do próprio ponto de vista sociológico pode parecer pouco usual é porque há relutância por parte de pensadores influentes em reconhecer que a elaboração sobre essa experiência humana essencial (deixar de temer ou recear as forças que Nós-outros mesmos criamos) qualifica a obra de Marx na sociologia.

Marx foi sociólogo no sentido estrito de reconhecer a laicização como experiência humana e a relatividade do arcaico e do histórico porque, ao chegar à descoberta da realidade social por trás do fetichismo da mercadoria, desencadeou o “desencantamento” da Economia Política, evidenciando nas representações desta última o estágio arcaico da consciência alienada e do pensamento a ela subjacente.

Na dialética das alienações desenvolvidas em “A Ideologia Alemã” (elaborada em 1845, mas publicada depois de 1883, postumamente [vii]), na qual como disse em resumo (a) – o trabalho é alienado em mercadorias; (b) – o indivíduo é alienado à sua classe; (c) – as relações sociais são alienadas ao dinheiro, nota-se que essas alienações são afirmadas como expressões da revolta de Marx contra Hegel e contra a equivocada análise hegeliana da realidade social, que projeta a alienação da sociedade e do homem em proveito do Estado.

Todavia, o ponto de vista microssociológico dos Nós-outros humanos não se limita em confirmar a alienação contra a análise hegeliana.

O desocultação da consciência alienada é igualmente afirmado quando, já igualmente em revolta contra a Economia Política no célebre “Rascunho da Contribuição à Crítica da Economia Política” (“Grundrisse..”), Marx relaciona diretamente a própria constituição da Economia Política à dominação pelas alienações, repelindo o desconhecimento do trabalho vivo.

►De fato, elaborando a Economia Política em modo separado da sociologia econômica, “os economistas burgueses estão de tal modo impregnados pelas representações características de um período particular da sociedade que a necessidade de certa objetivação das forças sociais do trabalho lhes parece inteiramente inseparável da necessidade da desfiguração desse mesmo trabalho pela projeção e pela perda de si, opostas ao trabalho vivo” [viii].

E Marx prossegue: “eles (os economistas) acentuam não as manifestações objetivas do trabalho, da produção, mas a sua deformação ilusória, que esquece a existência dos operários, para reter apenas a personificação do capital, ignorando a enorme força objetiva do trabalho que se exerce na sociedade, e que está na própria origem da oposição dos seus diferentes elementos” (ib.).

 

A liberdade libertadora no mundo da produção

 

Na medida em que integra a desocultação da consciência alienada levando à recuperação da prevalência da sociedade sobre a economia, o realismo sociológico de Marx é voltado para resgatar os Nós-outros humanos desfigurados pela alienação como projeção para fora de si ou perda de si, em que os economistas burgueses do século XIX situavam a objetivação das forças sociais do trabalho.

Há, pois, na abordagem de Marx o reconhecimento de uma negação do discursivo posta na e com a experiência humana que lhe permite alcançar distância cognitiva fundamental em relação ao universo mental bloqueado da Economia Política e por esta via situar a consciência alienada como fenômeno de psicologia coletiva dentro da sociologia, sem o que seria impossível descobrir a realidade social oculta (o trabalho humano, vivo).

Penetrado pelas características de um período particular da sociedade que leva à necessidade da desfiguração do trabalho, no universo mental bloqueado da Economia Política clássica predominam as representações resultantes da pressão que exercem gradualmente as forças sociais que não conseguimos dirigir.

Por sua vez, tal pressão das coisas impõe-se como força estranha que já não surge como o poder unido dos homens, mas, antes, surge como um elemento situado fora deles próprios, de que eles (os homens) não conhecem nem a origem, nem o objetivo (surge no exterior do psiquismo coletivo).

A experiência humana que Marx reconhece e que o eleva por encima dessa mentalidade impregnada pelas representações de uma força estranha situada fora dos homens, não se esgota na crítica histórica, mas é experiência da laicização do fetichismo da mercadoria em sociologia econômica: reconhecimento de que os Nós-outros humanos deixam de temer as forças que criam, e que esta liberdade libertadora é um fato essencial do mundo da produção [ix] .

Ao deixar de temer aquela força estranha e aplicar em sua crítica a experiência da laicização que dessacraliza o fetichismo da mercadoria, Marx desencadeou o desencantamento da Economia Política, evidenciando nas representações desta última o estágio arcaico da consciência alienada e do pensamento subjacente.

 

A experiência da laicização na crítica da consciência alienada

(Sobre a distância cognitiva)

 

►Deixando de lado a teoria bem conhecida, mas bastante improvável, que representa um suposto “ponto de vista do proletariado” [x], a conjectura da laicização aqui proposta em relação ao tipo de experiência que alimentou a atitude intelectual de Marx e o levou a alcançar distância cognitiva em face do fetichismo da mercadoria, para empreender a crítica da mentalidade dos economistas burgueses e desmistificar a consciência alienada, implica um aspecto da evolução intelectual de Marx que inclui o tema crítico histórico da “filosofia nova” de Feuerbarch, mas ultrapassa o quadro do humanismo prometeico do século XVIII e XIX para mergulhar na sociologia.

Sem embargo, a conjectura da laicização como experiência originária assimilada na atitude intelectual de Marx pode ser vista com clareza. Basta observar o escrito da “Introdução da Contribuição à Crítica da filosofia do Direito de Hegel” (1843), onde a laicização da religião se afirma como o princípio de desdogmatização da filosofia e do pensamento, o princípio fundante que abre a passagem para uma ciência do homem e da sociedade mediante a inversão da dialética de Hegel [xi].

O caráter mesmo do humanismo do século XVIII a impulsionar a Época das Luzes deixa claro a alta relevância da laicização como experiência demolidora dos dogmatismos, já que voltado para intensificar a confiança do homem em sua indústria e, por esta via, estabelecer o primado do natural e do mundo humano sobre o divino – daí humanismo prometeico. E todos sabem a influência do humanismo prometeico sobre o jovem Marx, através de Feuerbach, no ambiente dos hegelianos após o desaparecimento de Hegel.

Desta forma, não há inesperado algum em admitir que a distância cognitiva assumida por Marx resulta da aplicação da laicização na descoberta do fetichismo da mercadoria, levando à desmistificação da consciência alienada, tanto mais que um paralelo pode ser estabelecido com os trabalhos de outros sociólogos do início do século XX, como os mencionados Lucien Levy Bruhl e Marcel Mauss, para o que diz respeito às “formas que demonstram a primeira vista pertencerem a um período social em que a produção e as suas relações regem o homem ao invés de serem por ele regidas” (o período das sociedades arcaicas e do mito do maná), e que parecem à consciência burguesa uma necessidade muito natural [xii].

Trata-se como disse da laicização do fetichismo da mercadoria em sociologia econômica, com a recuperação do trabalho humano, vivo: “eles (os economistas) acentuam não as manifestações objetivas do trabalho, da produção, mas a sua deformação ilusória, que esquece a existência dos operários, para reter apenas a personificação do capital, ignorando a enorme força objetiva do trabalho que se exerce na sociedade (a sociabilidade), e que está na própria origem da oposição dos seus diferentes elementos” (ib).

Práxis social e dialética

 

Notem que a conjectura de aplicação da laicização, embora ponha em relevo a matriz prometeísta (no caso, a aspiração à libertação total de certos aspectos da alienação), não implica revalorizar o humanismo de Karl Marx em detrimento da sociologia.

É uma conjectura sociológica exclusiva. O caráter demolidor dos dogmatismos, do conceitual ou, em modo mais amplo, do discursivo, é um dado básico da experiência humana vivida ou construída com método, que há muito é compreendida no desenvolvimento da ciência.

Os epistemólogos já esclareceram que o espírito científico não repousa sobre crenças, sobre elementos estáticos, sobre axiomas não discutidos. A retificação dos conceitos realizada pela Relatividade, como disposição da cultura científica do século XX, é a prova do incremento psicológico que faz avançar a história dinâmica do pensamento. É no momento em que um conceito muda de sentido que ele tem mais sentido”; é então “um acontecimento da conceituação”.  Não se pode crer na permanência das formas racionais, na impossibilidade de um novo método do pensamento.  “O que faz a estrutura não é a acumulação; a massa dos conhecimentos imutáveis não tem a importância funcional que se supõe”.

Se o pensamento científico é uma objetivação, “deve-se concluir que as retificações e as extensões são dele as verdadeiras molas”.  Ao realizar o “incremento psicológico”, o pensamento não newtoniano absorve a mecânica clássica e dela se distingue; produz uma convicção que se prova como progresso [xiii].

Por sua vez, a disposição da experiência nas ciências da natureza se refere a conteúdos que neles mesmos nada têm de dialéticos ao passo que a experiência arregrada em sociologia, por sua vez, relaciona-se a conteúdos dialéticos, como o é a própria realidade social.

Do ponto de vista da práxis social, qualquer teoria da experiência tomada como unívoca e servindo a uma pré-concepção filosófica (sensualismo, associonismo, positivismo, pragmatismo), deforma a experiência, a estanca, destrói o imprevisível, a variedade infinita, o inesperado de seus quadros.

Realidade social, experiência e dialética consistem nas obras como o Direito, o Conhecimento, a Moral, incluindo seu aspecto de controles ou regulamentações sociais, por um lado, e, por outro lado, nos atos coletivos e individuais (juízos, intuições), frequentemente interpenetrados, conforme podem ver nas atitudes coletivas, implicando um quadro social em que escalas particulares de valores são aceites ou rejeitadas.

Em consequência, revela-se um exagero supor que no mundo dos produtos a alienação seria total: os atos não se deixam reduzir à objetivação nas obras de civilização e, por esta via, o conceito de estrutura social mostra-se o mais dialético. A proposição de que o mundo dos produtos – incluindo os argumentos, as teorias, os livros, os acervos, as bibliotecas – deva ser compreendido como não humano, sustentada por um filósofo formalista da ciência importante como Karl Popper [xiv], é estranha à sociologia diferencial.

A experiência é o esforço dos homens, dos Nós-outros, dos grupos, das classes, das sociedades globais para se orientarem no mundo, para se adaptarem aos obstáculos, para os vencer, para se modificarem e modificar seus arredores, sendo a essa compreensão que se refere a noção de práxis como sendo de uma só vez coletiva e individual.

 

Marx e as suas duas revoltas na conceituação.

 

Em relação à evolução de Marx, viram sua atitude de revolta contra as maneiras discursivas de julgar de Hegel e depois contra as da Economia Política, e que suas descobertas se desdobram dessas duas revoltas na conceituação: (1) contra a análise hegeliana da realidade social em que, equivocadamente, Hegel estabeleceu a alienação da sociedade e do homem em proveito do Estado; (2) contra a Economia Política, que se mostra impregnada pelas representações (coletivas) características de um período particular da sociedade, em que a primazia cabe às forças materiais.

A tese aqui é de que as duas revoltas na conceituação engajadas por Marx nutrem-se na experiência da laicização, como experiência humana demolidora dos dogmatismos, que não somente ultrapassa o quadro intelectual dos jovens hegelianos, mas mergulha na sociologia.

Existe ampla bibliografia sobre a atividade do jovem Marx e suas relações no ambiente prometeísta dos jovens hegelianos, logo após o desaparecimento de Hegel. Bastam aqui as observações de Ernst Bloch em sua obra “Sujet-Objet” [xv], que dimensionam admiravelmente a contribuição de Feuerbarch para a superação do hegelianismo.

Observam que a “filosofia nova”, antropológica, então debatida no ambiente prometeísta dos jovens hegelianos é tida se encontrar, a respeito da filosofia racional de Hegel, na mesma proporção que esta a respeito da teologia. Hegel havia dito que, no homem, Deus se conhece ele mesmo; Feuerbach retorna a proposição: em seu Deus, o homem se conhece ele mesmo somente. Por consequência, os magníficos atributos divinos que o homem conferiu no mais além à sua própria alienação, devem ser restituídos à sua verdadeira origem: o coração humano, o amor humano, a tendência humana à perfeição.

Ao modo encontrado na época do iluminismo, Feuerbach reduz os deuses a sombras gigantescas da ignorância, ao mesmo tempo em que os apresenta como a melhor parte do homem duplicado, até defini-los como as projeções transcendentes do conteúdo dos desejos humanos ¾ aspirações do coração transformadas em seres efetivos.

Tal sua contribuição: Feuerbach se empenhou em levar a sério a importância e a dificuldade da religião para a “filosofia nova”. Ele se contrapôs à indiferença que, a esse respeito, contaminou o ambiente após o desaparecimento de Hegel ¾ quando se tomava por ateísmo o que não passava de omissão pa­ra com a esfera do religioso.

Sua antropologização abre então uma possibilidade de reflexão sobre o problema de um legado religioso, e o ateísmo, ao invés de ser um fenômeno de rejeição, recebe um conteúdo (vem a ser identificado à alienação religiosa). Foi Feuerbach quem chamou a atenção de Marx para o termo “alienação”, empregando-o para descrever a sujeição da humanidade à religião que ela própria criara.

Enfim, essa problemática feuerbachiana dos primeiros escritos de Marx está, como se sabe, na origem da chamada “concepção materialista da história”.

 

Humanismo e sociologia em Marx

 

►Na verdade, não eram a “alienação religiosa” nem o problema do ateísmo que interessavam a Marx, mas a construção de uma nova ciência do homem e da sociedade em ato, como diria Saint-Simon: isto é, a sociologia.

A alienação é um termo que tem ascendência no humanismo prometeico comum à maior parte dos filósofos do século XVIII e que Marx, influenciado por Feuerbach, foi buscar em “A Fe Fenomenologia do Espírito”, dando-lhe, porém, vários sentidos sociológicos que ele nunca tivera em Hegel nem em Feuerbach.

Em Hegel, dialética é primeiro que tudo Deus, em seguida as suas emanações, o Espírito e a Consciência que se alienam no mundo, para reconduzi-lo a Deus e à sua eternidade vivente.

Referida à práxis social, em Marx, a alienação é (a) medida da autonomia do social, (b) exteriorização do social, e (c) perda da realidade, como graus de cristalização da realidade social que podem entrar em conflito com os elementos espontâneos desta, levando-a a tornar-se vítima de ideologias falazes, tendo por resultado a dominação e a sujeição que ameaçam as coletividades tanto quanto os indivíduos [xvi] .

Daí que o ponto de vista da antropologização (Hegel, Feuerbarch) se converte em Marx em ponto de vista da laicização, como experiência humana demolidora dos dogmatismos.

A antropologização é reduzida ao momento da laicização, em que os homens deixam de temer as forças que criam. Hegel havia dito que, no homem, Deus se conhece ele mesmo; Feuerbach retorna a proposição e assinala a laicização da religião em humanismo: em seu Deus, o homem se conhece ele mesmo somente.

Reconhecendo-o e retirando-o do debate então centrado na chamada nova filosofia, Marx explora o momento da laicização dos dogmas, tomando-o como o foco da nova ciência do homem e da sociedade.

Em sua orientação original, importa menos projetar um conteúdo para o ateísmo, que Feuerbarch encontrou na alienação religiosa, mas, antes, aprofundar a laicização dos dogmatismos, fazer avançar a experiência [dialética] demolidora dos conceitos cristalizados.

Não se busca mais, em Marx, elaborar uma nova filosofia a partir da antropologização, mas sim fundar a sociologia e a dialética.

Práxis e sociologia

O alcance desalienante da dialética sociológica é indireto e, mais do que um procedimento desmistificador do “falso saber”, a dialética deve ser vista a partir do empirismo pluralista efetivo (multiplicidade e irredutibilidade dos Nós-outros e das relações com outrem), isto é, como uma orientação demolidora não somente dos dogmatismos em geral, mas, notadamente, a dialética sociológica derruba o preconceito filosófico inconsciente que afirma um Eu genérico idêntico em todos.

Antes de subordiná-la exclusivamente à historicidade e ao saber histórico, houve que desenvolver a dialética como ligada à experiência pluralista e à variabilidade, isto como sabem por exigência da constatação de que, em os Nós-outros, as relações com outrem não podem ser identificadas nem às fases históricas da sociedade global, nem aos agrupamentos particulares, como houvera proposto Durkheim.

E isto é assim porque a diversidade irredutível dos Nós-outros faz com que tais manifestações da sociabilidade por relações com outrem não admitam síntese que ultrapasse a combinação variável dessas relações microscópicas, como espécie da sociabilidade, tornando como disse artificialista toda a tentativa para identificar as relações com outrem às fases históricas da sociedade global ou aos agrupamentos particulares.

Mesmo no estado muito valorizado pelos estudiosos da história social, quando as relações com outrem são distribuídas hierarquicamente e servem de ponto de referência a uma estrutura social (por exemplo: relações com o Estado, relações com os empresários, relações com os partidos políticos etc.), a síntese não ultrapassa como sabem o estado de combinação variável. É pela microssociologia que se põe em relevo a variabilidade no interior de cada grupo, de cada classe, de cada sociedade global, de cada estrutura social.

 

Graus de prometeísmo

 

Há diferença entre o tempo sociológico e o tempo histórico. O caráter histórico de uma realidade social é múltiplo, havendo graus de percepção de que a ação humana concentrada pode mudar as estruturas e permitir revoltas contra a tradição (graus de prometeísmo).

Expresso na historiografia, o saber histórico se concentra exclusivamente sobre a realidade histórica, acentuando muito o primado das sociedades globais como sujeitos “fazendo história”.

Por sua vez, a sociologia salienta “o complexo jogo” entre as escalas do social que se pressupõem uma a outra, quer dizer: procura confrontar a realidade histórica com “os planos sociais não históricos ou pouco históricos”, como o são os elementos microssociais (os Nós-outros, as relações com outrem) e os grupais, respectivamente.

Sobressai que as manifestações prometeicas da realidade social são as que menos se prestam à unificação, registrando-se aqui um segundo foco de tensão com os historiadores, já que estes tendem para uma unificação muito intensa da realidade social, enquanto o sociólogo reconhece a resistência da realidade histórica à unificação, facilmente verificada no conflito de versões.

Por tal razão, o sociólogo busca acentuar a diferenciação e a diversificação, que considera muito ativada pelos planos sociais em competição. Daí a descoberta da multiplicidade dos tempos sociais [xvii].

O caráter muito mais continuísta do método histórico se observa na medida em que a história, como ciência, “é conduzida a vedar as rupturas, a lançar pontes entre diversas estruturas”, o que é uma manifestação do pensamento ideológico.

Ao referir sua dialética à práxis social (por influência de Saint-Simon e Proudhon, que os assimilou e os superou), Marx ultrapassou a própria vertente do humanismo burguês. O “Eu genérico” idêntico em todos é um preconceito legado da filosofia do século XVIII através de Rousseau (vontade geral) e Kant (intuição transcendente), e preservado inadequadamente na crença metodológica de que existe uma estrutura lógica na base de toda a sociedade.

Como práxis e mentalidade da classe burguesa, o “Eu genérico” foi examinado por Henri Lefebvre em seu notável ensaio sobre o psiquismo da estrutura de classes, que será comentado aqui, logo adiante.

 

***

A laicização como fator de relativização do arcaico e do histórico

 

Acresce que o fetichismo da mercadoria condicionando a consciência social (como viram em relação aos economistas) não é sem paralelo na condição humana.

Neste ponto cabe ajustar estes comentários.

Com efeito. Na medida em que precisou ultrapassar as metáforas das análises por demais alegóricas da antropologia filosófica desenvolvida por Ernst Cassirer [xviii], por exemplo, o problema das ciências humanas e sociais passa por esse paralelo com o fetichismo da mercadoria descoberto por Marx, que introduz a relatividade do arcaico e do histórico.

Do ponto de vista da sociologia diferencial, e à exceção de Ernst Bloch que descobriu a não contemporaneidade no processo histórico [xix], as tentativas marxistas de Engels a Sartre fracassaram em grande parte devido ao etnocentrismo da história e à projeção exagerada da estrutura de classes sobre os tipos de sociedades globais diferenciados ao longo das civilizações.

Da mesma maneira em que Engels projetou as relações de propriedade para além da história sem dimensionar o peso do elemento sobrenatural nas sociedades “primitivas”, Sartre em sua “Critique de la Raison Dialectique” imaginou que o foco mais originário da dialética seria a práxis das próprias classes sociais, produzindo uma sociologia onde o coletivo (no seu caso um serialismo) não surge dos macrocosmos das irredutíveis formas de sociabilidade, como já assinalei em outro comentário [xx] .

Quando não é o etnocentrismo, impera o retorno aos preconceitos filosóficos herdados do século XVIII (consciência transcendental em Kant; vontade geral em Rousseau) e busca-se fundar a metodologia das ciências sociais em um estruturalismo lógico presente na base de toda a sociedade, como sugeriu Claude Lévi-Strauss.

Por contra, ao tempo em que Marx constata o estágio arcaico da consciência alienada, outros sociólogos como Lucien Lévy-Bruhl, primeiro, e Marcel Mauss (1872 – 1950), depois, (este último colaborador direto de Durkheim) aprofundavam os estudos sobre as sociedades arcaicas e sobre o mito arcaico do maná-mágico e descreviam a vida nesse tipo de sociedades – vida humana, social, econômica e política – como sendo inteiramente penetrada pelo sobrenatural, seja transcendente (Religião) ou imanente (Magia como obra de civilização [xxi]), cujo conflito e cooperação constituem sua tensão e princípio motor.

Na leitura sociológica, para descrever o estágio arcaico da consciência alienada deve-se relacionar a teoria do fetichismo da mercadoria à análise do mito arcaico do maná-mágico com aplicação da laicização.

Neste sentido, não há negar o mérito de Gurvitch em reaproveitar os materiais etnográficos e aportar novos conhecimentos imprescindíveis à compreensão do Homo Faber, inclusive incorporando neste marco as análises positivas (não místicas) de Henri Bérgson, de que já ofereci um comentário em outra oportunidade [xxii].

 

Para uma análise mais desenvolvida, veja “Karl Marx e a Sociologia do Conhecimento”.

 

NOTAS

[i] A “Introdução da Contribuição à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel“, de Karl Marx, é um escrito de 1843 que apareceu em 1844, no primeiro número dos Annales Franco-allemands (Deutsch-französische Jahrbücher), uma revista dirigida por Karl Marx no momento de seu exílio em Paris. Quanto a Hegel, há boa edição francesa de sua grande obra. Vejam: Hegel, G.W.F.: “La Phénoménologie de l´Espirit” – Tome I e Tome II, Paris, Aubier, 1939 (Tome I), 358 pp.; 1947 (Tome II), 359 pp.; Versão francesa por Jean Hyppolite tirada da Edição  Lasson – J. Hoffmeister, W. II 4º ed., 1937; título em Alemão: “Die Fhaenomenologie des Geistes”.

[ii] Gurvitch, Georges (1894-1965): “Dialectique et Sociologie“, op.cit.

[iii] Cf. Gurvitch, Georges: “A Vocação Actual da Sociologia –vol.II: antecedentes e perspectivas”, 1986, 567 pp. (1ª ed, PUF, 1957). Op. cit. Pág.279.

[iv] Wrigth Mills, C. e Gerth, Hans – Organizadores: « Max Weber : Ensaios de Sociologia »,  1971, 530 pp.(1ª edição em Inglês : Oxford University Press, 1946). Cf. sobre a Teodicéia às págs. 318 sq e 409 sq.Op.cit.

[v] Esse tema da experiência da laicização na afirmação do Homo Faber é desenvolvido com profundidade em sociologia diferencial por Gurvitch, que investiga o problema da origem da técnica e da moralidade que lhe corresponde (a moralidade autônoma em face das crenças em símbolos tidos por sobrenaturais) tomando por fonte de interpretação e reflexão a laicização no ambiente dos melanésios, como tipo originário de sociedades arcaicas analisado por Marcel Mauss com os materiais empíricos acumulados desde os trabalhos etnográficos de Codrington ( Robert Henry, 1830 -1922 – “The Melanesians: Studies in their Anthropology and Folk-Lore“, 1891). Cf. Gurvitch, Georges: “La vocation actuelle de la sociologie”- Tome II : “Antécédents et perspectives”, Paris, Presses Universitaires de France, 1963, 504 págs (Bibliothèque de Sociologie Contemporaine).

[vi] Como transposição do coeficiente de realidade do indivíduo para o objeto inerte, a reificação é um processus psicológico permanente, agindo secularmente no âmbito da produção para o mercado. Cf. Goldmann, Lucien: Recherches dialectiques. Paris: Gallimard, 1959. Pour une sociologie du roman. Paris: Gallimard, 1973, op. cit.

[vii] Cf. “A Ideologia Alemã”, tradução francesa, ed. Molitor, vol. VI p.240, apud G. Gurvitch, “A Vocação…”, vol. II, op.cit.

[viii] Cf. Marx. Karl: “Grundrisse…”, edição francesa, pág.176, apud Gurvitch, Georges: “A Vocação Actual da Sociologia –vol.. II”, págs. 341 sq.

[ix] Liberdade libertadora, ou seja, liberdade para a liberdade, porque a liberdade que se afirma contra o medo / temor é necessariamente duplicada: é preciso ja ser livre para deixar de temer as forças que criamos como sobrenaturais. Na verdade, a liberdade afirma-se sempre libertadora. A tese contrária é impossível: uma vez exercida, nenhuma liberdade deixa de ser perpetuamente afirmada. Sem embargo, pode-se admitir o abuso de liberdade. Por outro lado, nas sociedades históricas, chega-se à consciência da liberdade exercida nas tentativas de planejar e dirigir as mudanças de estrutura social.

[x] A coincidência entre o psiquismo de classe e a consciência de classe só tem sentido em uma teoria privilegiando uma consciência de classe especial, como o faz o jovem Lukacs em “Histoire et Conscience de Classe“, que atribui à consciência de classe do proletariado um caráter singularmente privilegiado. Tal teoria enseja uma visão majestosa e de estilo filosoficamente clássico, criticável por fazer o proletariado delegar sua consciência em representantes que, a mais do plano político, encarnariam a sua concepção do mundo. Por isso, em lugar de realizar a filosofia ultrapassando-a conforme o pensamento de Marx, o jovem Lukacs restitui à filosofia um papel inquietante. Cf. Lefebvre, Henri (1901 – 1991): “Psicologia das Classes Sociais“, in Gurvitch e al.: Tratado de Sociologia – vol.2‟ (Traité de Sociologie, PUF 1960), Porto, Iniciativas Editoriais, 1968, pp.505 a 538.

[xi] Uma boa edição digital da Introdução da Contribuição à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel encontra-se acessível na Web Marxists Internet Archives: http://www.marxists.org/francais/marx/works/1843/00/km18430000.htm

[xii] Cf. Marx. Karl: “Grundrisse…”, edição francesa, pág.176, apud Gurvitch, Georges: “A Vocação Actual da Sociologia –vol.. II“, págs. 341 sq. Op.cit.

[xiii] Bachelard, Gaston: “O Novo Espírito Científico”, São Paulo, editora Abril, 1974, coleção “Os Pensadores”, vol.XXXVIII, pp.247 a 338 (1ª Ed. 1935).

[xiv] Popper, Karl: ‘Conhecimento Objetivo: uma abordagem evolucionária’, São Paulo/Belo Horizonte, EDUSP/editora Itatiaia, 1975, 394 pp, traduzido da edição inglesa corrigida de 1973 (1ª ed: Londres, Oxford University Press, 1972).

[xv] Cf. Bloch, Ernst (1885-1977): “Sujet-Objet: Éclaircissements sur Hegel”, Paris, Ed. Gallimard, 1977, 498 pp.;Versão francesa por Maurice de Gandillac, da edição alemã de Frankfurt, Ed. Surhkamp, 1962; (1ª Ed.em alemão: 1951).

[xvi] Cf. Gurvitch: “A Vocação Actual da Sociologia-vol. 2”, op.cit.

[xvii] A multiplicidade dos tempos sociais foi objeto de análise e descrição por Gurvitch em sua obra citada “Determinismos Sociais e Liberdade Humana”.

[xviii] Cassirer, Ernst (1874 –1945) : “La Philosophie des Formes Symboliques”(La Conscience Mythique), trad. Jean Lacoste, Paris, les editions de Minuit, 1972, 342pp, (1ª edição em Alemão,1925).

[xix] Ver meus comentários em “O Tradicional na Modernização: leituras sobre Ernst Bloch”, http://www.oei.es/salactsi/ErnstBloch.pdf  ,Web da OEI, Maio de 2009, 130 págs.

[xx] Cf. Lumier, Jacob (J.): “A dialética sociológica, o relativismo científico e o ceticismo de Sartre: aspectos críticos de um debate atual do século vinte“, OpenFSM,  artigo, 50 págs  pdf,  2009 link: http://openfsm.net/people/jpgdn37/jpgdn37-home/A-Dialetica-Sociologica-_Sartre_Gurvitch.pdf

[xxi] Seguindo a Marcel Mauss e aprofundando a abordagem diferencial Gurvitch reconhece que o mito do Maná é independente do totemismo, privilegiado este por Durkheim.

[xxii] Leitura da Teoria de Comunicação Social desde o ponto de vista da Sociologia do Conhecimento (Ensaio, 338 págs.). Web da O.E.I. / E-book / pdf, 2007http://www.oei.es/salactsi/conodoc.htm http://www.oei.es/salactsi/lumniertexto.pdf  vejam páginas de 184 a 196.

Posted in alienação, análise e interpretação, ciências humanas, classe burguesa, coisificação, conhecimento, critica historica, desenvolvimento, dialética, docência, economia, ensino, epistemologia, estratificação, Estudo Crítico; Sociologia., formação, história, história social, history, homo faber, ideologia, laicidad, liberdade, mentalidade, microssociologia, modernização, mundo do trabalho, praxis, problema sociológico, problemas sociológicos, psicologia coletiva, psiquismo coletivo, realidade social, realismo, Saint-Simon, Sartre, século vinte, século XIX, sistemas cognitivos, sociabilidade, sociólogo, sociedad, sociedade, sociedade industrial, sociologia, sociologia do conhecimento, solidariedade, teoria sociológica, trabalhadores, utilitarismo, utopia, variabilidade, vida intelectualTagged desenvolvimento, dialética, ensino-de-sociologia, estrutura de classes, fetichismo, laicidade, laicização, libertação, Marx, problemas de sociologia, sociólogo, sociologia, sociologia do conhecimento, solidariedade, tópico 05, teoria sociológicaLeave a comment

A Sociologia dos Sistemas Cognitivos (Apresentação, Sumário e Introdução do livro)

Posted on May 12, 2017September 9, 2017 by Jacob (J.) Lumier

 

A Sociologia dos Sistemas Cognitivos:

Observações sobre os conhecimentos em Correlações com as mentalidades coletivas

Jacob (J.) Lumier

 

Editor:

Bubok Publishing S.L., Madrid, março 2017, 264 págs.

Link: http://www.oei.es/historico/cienciayuniversidad/spip.php?article7434

 

Epígrafe

 

A língua, a intervenção do conhecimento, e o direito espontâneo são as instâncias por via das quais a consciência toma parte das forças produtivas em sentido lato, e desempenha um papel constitutivo nos próprios quadros sociais (grupos, classes, sociedades). Daí a relevância da sociologia do conhecimento, como disciplina científica específica, indispensável à formação intelectual, à tomada de consciência e ao ensino.

Apresentação

 

Redigido em 2008 e ora modificado, o presente livro é composto de vários artigos do autor [1], nos quais expõe as orientações diferenciais da sociologia do conhecimento, em continuidade do projeto de introdução intitulado O Conhecimento na Realidade Social, divulgado na OEI em janeiro de 2016 [2].

Em alternativa para as chamadas ciências da cognição – as quais, frequentemente, limitam a simbolização e o aprendizado ao indivíduo isolado –, neste livro de sociologia, os processos mentais são observados como implicados na comunicação social, e integrados nas mentalidades coletivas. O autor chama atenção para as dinâmicas espontâneas das avaliações coletivas, incluídos os juízos, as opiniões, carências, satisfações, esforços, sofrimentos e ideais.

Desenvolve um posicionamento crítico com duplo alcance: (a) contribui para superar o preconceito que desfavorece a sociologia do conhecimento, pelo qual haveria uma estrutura lógica na base das sociedades, em detrimento do psiquismo coletivo; (b) em face da confusão com a gestão dos arquivos eletrônicos, afirma o caráter humano do conhecimento, de que fazemos experiência nos debates, avaliações e reflexões dos temas coletivos reais.

Toma como básico que o estudo dos sistemas cognitivos não deve permanecer restrito às funções cerebrais e a psicologia individual. Compostos de classes e formas de conhecimento, os sistemas cognitivos existem em correlações funcionais com os quadros sociais, e têm existência independente das representações e estados mentais individuais, os quais são neles integrados.

Rio de Janeiro, março de 2017

Jacob (J.) Lumier /

 

Adendo em 09 de setembro 2017:

Para mais informação sobre o estatuto sociológico dos sistemas cognitivos veja o artigo NOBRE, Farley; TOBIAS, Andrew  e  WALKER, David. Cognição organizacional: revisão, conceitualização e contexto estratégico. Prod. [online]. 2016, vol.26, n.4 [citado  2017-09-09], pp.742-756. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-65132016000400742&lng=pt&nrm=iso&gt;.  Epub 27-Out-2015. ISSN 0103-6513.  http://dx.doi.org/10.1590/0103-6513.108212.


 

Sumário da obra

Epígrafe. 9

Apresentação. 11

Sumário. 13

Introdução. 19

Conhecimento e Quadros Sociais 19

Os Conhecimentos São Correlacionados aos Quadros Sociais 21

Pluralismo Social Efetivo. 25

Nem Culturalismo, Nem Marxismo: Notas sobre o problema da sociologia do conhecimento. 29

A Eficácia Do Conhecimento. 30

O Papel De Argamassa 31

A Comunicação Dentro Do Psiquismo Coletivo  33

A Subjetividade Coletiva 35

A Ineficácia Do “Saber Adequado” 40

A Linguagem De Conjuntos Em Sociologia. 43

A Introdução Da Dialética em Sociologia 44

O Método Dialético. 45

A Complementaridade Dialética 46

A Implicação Dialética Mútua 48

A Ambiguidade Dialética 50

A Polarização Dialética 52

A Reciprocidade De Perspectiva 53

O Hiperempirismo Dialético. 55

O Alcance Realista Da Dialética 56

O Problema Da Posição Filosófica 57

O Hiperempirismo Dialético É Uma Metodologia 59

As Hierarquias Múltiplas Em Teoria Sociológica  63

O Problema Chamado Passagem Do Grupo À História 64

Pluridimensionalidade Da Realidade Social 67

O Problema Da Possibilidade Da Estrutura. 70

Pluralismo Descontinuísta E Desdogmatização  75

Os Tipos Ideais Weberianos 76

O Método Tipológico. 79

A Visão De Conjuntos 80

Uma Análise De Atitudes 82

O Pluralismo Descontinuísta 84

As Atitudes Individuais E As Coletivas 86

A Leitura Da Revista “Dialectique” (1947) 89

O Problema Da Ligação Dialética/Experiência 92

O Mundo Dos Valores e as Condutas Efervescentes  95

O Espontaneísmo Social E Coletivo  96

As Condutas Coletivas Efervescentes 97

A Função Simbólica 98

O Caráter Racional Dos Símbolos 98

O Conflito Imaginado Do Indivíduo E Da Sociedade 100

A Intervenção Do Sociólogo. 102

A Noção Antidogmática De Mumificação Do Discursivo  103

A Ordem Dos Conhecimentos No Capitalismo  107

O Papel Preponderante Do Saber 108

A Reanimação Do Estado. 109

O Salto Prodigioso Da Ciência 112

A Baixa Influência Do Conhecimento Político  116

O Incipiente Conhecimento De Outro  120

A Presença Da Classe Burguesa No Saber  123

O Coeficiente Social Do Conhecimento  124

A História E A Sociologia 126

A Filosofia E A Ciência 126

Os Papéis Sociais Da Classe Burguesa 128

A Consciência De Classe Otimista Da Burguesia 129

Sociologia e Psicologia coletiva  133

Os Níveis Da Consciência Alienada 134

Objetivação E Desfiguração do Trabalho  135

A Mentalidade Adstrita À Personificação Do Capital 136

O Esquema Das Alienações 137

Reificação E Função De Representação  141

Um Processo De Unilateralização. 142

A Função De Representação Da Vida Psíquica 143

As Três Dimensões Do Psiquismo. 144

Reflexão Da Divisão Do Trabalho Social Em Regras De Análise 146

Consciência De Classe E Produção Simbólica 147

O Problema Do Eu Genérico Em Ciências Humanas: 149

A Descoberta Da Contemplação. 150

A Consciência Aberta Como Fenômeno De Classe 153

A Mudança Na Sociedade Industrial 155

Uma Tendência Para Universalizar A Pessoa Humana 157

Descontinuidades e Contingências na Sociologia  161

A Visão De Conjuntos 162

A Pluridimensionalidade Da Realidade Social 164

As Objetivações Do Universo Simbólico  169

Os Processos De Legitimação. 170

A Reificação Da Realidade Social 172

Sistemas Cognitivos. 175

O Conhecimento Em Perspectiva Sociológica 176

O Interesse Do Pensamento Especulativo  177

A Dimensão Constringente Da Realidade Social 178

Os Conhecimentos E A Mentalidade coletiva 179

O Coeficiente Existencial Do Conhecimento  180

Alcance E Aplicação Da Sociologia Do Conhecimento  183

O Saber Como Recurso Para Se Orientar No Mundo  186

O Estudo Das Classes De Conhecimento  188

O Conhecimento De Outro e o De Senso Comum  191

A Sociologia Do Conhecimento De Outro  192

A Sociologia Do Conhecimento De Senso Comum Ou Da Vida Cotidiana. 194

A Sociologia Do Conhecimento Técnico E Do Político  197

O Caráter Específico Do Conhecimento Técnico  198

Partidarismo E Realismo conciliados 200

A Fusão De Conhecimentos 202

A Sociologia do conhecimento filosófico  207

Conhecimento Reflexivo Em Segundo Grau  208

Um Triplo Limiar Comum. 209

O Conhecimento Filosófico Nas Cidades-Estados. 212

O Individualismo Greco-Romano. 214

Uma Visão Nova 216

O Conceito De Realidade Histórica 217

As Tendências Filosóficas 218

Filosofia E Ciência 220

A Sociologia Das Formas Do Conhecimento  223

Diferenciação Das Formas Do Conhecimento  224

O Conhecimento Místico E O Racional 225

O Conhecimento Empírico E O Conceitual 226

O Conhecimento Positivo E O Especulativo  227

O Conhecimento Simbólico E O Adequado  228

Notas Complementares. 232

Guia de termos sociológicos mencionados  244

Perfil do autor Jacob (J.) Lumier  246

Notas. 248

Introdução

A colocação do conhecimento em perspectiva sociológica implica mais do que um procedimento metodológico: afirma uma realidade social histórica bem marcada no século vinte, que o sociólogo tem a competência de pôr em relevo.

 

Conhecimento e Quadros Sociais

Podem atribuir a pouca divulgação da sociologia do conhecimento à influência das teorias de interação e de papéis sociais, que desconsideram a variabilidade como um dado básico da realidade social. Pelo contrário, todo o mundo faz a experiência da variabilidade. Todos sabem que:

(a) – os indivíduos mudam de atitude em função dos grupos aos quais pertencem – sendo os grupos formados exatamente com base na continuidade e no caráter ativo de uma atitude coletiva;

(b) – os papéis sociais que os indivíduos assumem, ou os personagens que eles encarnam, mudam segundo os círculos sociais diferentes a que eles pertencem [i].

Desta sorte, um pai ou um marido muito autoritário, p.ex., pode simultaneamente desempenhar o papel de um colega particularmente atencioso, etc.;

(c) – em cada grupo um indivíduo desempenha um papel social diferente: ajustador, vendedor, professor, etc.; por outro lado, pode ele desempenhar nesses grupos papéis umas vezes sem brilho, outras vezes brilhantes; umas vezes subordinados, outras vezes dominantes;

(d) – os mesmos indivíduos e os mesmos grupos podem, segundo estruturas e conjunturas sociais variadas, desempenhar papéis muito diferentes e até opostos (ib. p. 106-7).

Uma vez que deixemos de lado as orientações das teorias de interação e de papéis sociais [ii] [ver notas complementares], poderemos reconhecer que o conhecimento varia em função dos quadros sociais.

Basta, lembrar que, na prática científica, as proposições dos problemas sofrem a influência dos “contextos sociais” pela mediação dos próprios conceitos operacionalizados nas formulações dos pensadores, já que os conceitos existem como “significados socialmente condicionados”.

Como semântica e sintaxe, a linguagem é inseparável de sua dimensão pragmática, na qual se inclui a dimensão sociológica. Desta sorte, em face de certas indagações ou seleções e proposições dos problemas, constata-se, como assinalou Wright Mills, uma influência do inter-relacionamento entre os conceitos disponíveis, por um lado, e, por outro lado, aquilo que se toma como problemática. Em suma, existe uma correlação funcional interligando os significados e a as problemáticas selecionadas pelos pesquisadores, sendo por meio dessa correlação que as indagações científicas são introduzidas no conjunto da vida social.

 

Os Conhecimentos São Correlacionados aos Quadros Sociais

A sociologia diferencial estuda o saber a partir dos sistemas cognitivos existentes nos diversos tipos de sociedades globais que atravessam a história. Diferencia os conteúdos cognitivos em gêneros e formas de conhecimento que descreve e classifica. Em seus procedimentos, a sociologia encontra-se em medida de oferecer um estudo científico do conhecimento bem mais completo do que não poderiam fazê-lo as orientações reducionistas que estudam a cognição.

Nestas, deixa-se frequentemente de lado o fato de que não há comunicação fora do psiquismo coletivo, de tal sorte que o estudo das operações lógicas na extensão das funções cerebrais, por exemplo, ao impor a redução imprópria da comunicabilidade, confronta-se à impossibilidade em esclarecer a ligação das ditas operações lógicas ao conhecimento do qual fazemos experiência, quando dialogamos e enunciamos juízos, avaliações, reflexões, temas.

Deve ter em conta que não se trata aqui apenas do conhecimento científico, mas de todo o juízo que pretenda afirmar a verdade sobre alguma coisa: por conhecimento devem entender os atos mentais em que se combinam em diferentes graus a experiência imediata (as intuições intelectuais, que fazem participar diretamente do real) e mediata ou indireta (as intuições emotivas e as voluntárias) com o juízo. Nota que as intuições intelectuais, as emotivas e as voluntárias são vividas ou experimentadas pelos Nós-outros, grupos, sociedades globais, sendo por via das quais, como sabem, que o plano dos valores e ideias se revela eficaz.

As orientações reducionistas deixam na sombra a ligação das operações lógicas e das funções cerebrais ao conhecimento humano [iii]. Não que o conhecimento de que fazemos a experiência humana seja refratário ao exame científico por não passar de mera ideologia.

É equivocado confundir e reduzir os símbolos sociais – que incluem as significações de uma língua – ao domínio da ideologia, confusão já questionada em relação ao behaviorismo, cujas explicações do comportamento, tomado este à margem de toda a implicação simbólica, conduzem às conclusões mais absurdas quando aplicadas às situações humanas e sociais.

A experiência é o esforço dos homens, dos Nós-outros, dos grupos, das classes, das sociedades globais para se orientar no mundo, para se adaptar aos obstáculos, para os vencer, para se modificar e modificar seus entornos. A variação do conhecimento em função dos quadros sociais pode ser pesquisada e confirmada em modo empírico, e constitui um critério científico seguro que dispõe a sociologia para verificar os conhecimentos humanos. Mas não é somente esse problema da verificação segundo critérios científicos que a sociologia soluciona.

A procedência das ordens ou da comunicabilidade em nossos juízos, critérios, avaliações, e as vias por meio das quais novos conhecimentos intercomunicados chegam a ser produzidos são outros tantos problemas científicos que a sociologia esclarece, ao estudar os sistemas cognitivos existentes e decompô-los em hierarquias de classes e formas do conhecimento.

Isto não significa subscrever a orientação abstrata na qual se afirma a suposta possibilidade da ordem social para desenvolver a sua própria lógica, como universo de relações simbólicas, tomada essa ordem como modo de distribuição do prestígio social, à maneira de Bourdieu [iv].

A projeção de uma lógica de simbolização da posição social, ou da distinção entre grupos de status, implicando inclusão e exclusão, atribuída a Max Weber, ressoa uma conjectura muito arbitrária, não somente em razão de tratar o sistema social como articulado unicamente aos mencionados polos da exclusão e da inclusão, mas porque torna diluída a referência aos quadros sociais específicos, como aspectos do estudo sociológico da consciência coletiva implicados nos sistemas cognitivos.

Quer dizer, tal lógica de simbolização das posições sociais seria válida em maneira abstrata para qualquer estrutura social, como se as lógicas sociais não sofressem variações em função de quadros sociais precisos e dos tipos de sociedades globais.

Na verdade, para além da ideologia, a sociologia diferencial não se limita o estudo das representações e funções representativas, e nem de longe pretende estabelecer a classificação dos conteúdos cognitivos em relação às justificativas ideológicas, sejam elas quais forem.  Aliás, a sociologia dispõe de critérios operativos para desdogmatizar seus “conceitos” ou quadros operativos de análise e explicação [v].

Além disso, podem aprender com o mencionado autor, que a sociologia é igualmente capaz de negar operativamente qualquer pré-julgamento em relação aos conteúdos cognitivos.

Sem embargo, propõe-se abarca-los em conjuntos, a partir da distinção dos vários gêneros do conhecimento, os quais, por sua vez, diferencia em classes e formas ao decompor os sistemas cognitivos, igualmente abarcados em conjuntos e em modo comparativo, a partir dos tipos de sociedades globais que atravessam a história.

A crença de que qualquer tentativa em estudar o conhecimento para-além das simples funções lógicas e cerebrais careceria de alcance científico, atribuída às chamadas “ciências da cognição”, desconhece a imanência recíproca do individual e do coletivo, verificadas pelas teorias de consciência aberta, referidas e aplicadas no presente trabalho [vi] [ver Notas Complementares].

Na medida em que possibilitam colocar o conhecimento em perspectiva sociológica, a aplicação dessas teorias [vii] permite compreender que os conhecimentos efetivos são correlacionados e eficazes como regulamentações sociais, e permite especialmente assinalar as diferenças nas fases cognitivas por que passam os sujeitos sociais para, assimilando a sua virtualidade simbólica, se constituírem como tais, isto é, se atualizarem como intermediários e se efetivarem em quadros sociais reais.

Para ver que os conhecimentos são correlacionados aos quadros sociais, basta lembrar que, no âmbito da prática científica, toda a hipótese nova traz a marca da estrutura da sociedade em que se elaborou, como, aliás, já nos esclareceu C. Wright Mills [viii].

Quer dizer, a colocação do conhecimento em perspectiva sociológica implica mais do que um procedimento metodológico: afirma uma realidade social histórica bem marcada no século vinte, de que o sociólogo tem a competência para pôr em relevo e para esse propósito é chamado.

Lembra que o coeficiente social do conhecimento intervém também através da conceituação, a qual, geralmente, está avançada em face da experimentação.

 

Pluralismo Social Efetivo

 

Entretanto, há que eludir o posicionamento temerário de alguns autores interessados no estudo das habilidades como conteúdos cognitivos, que, na sustentação desse interesse de pesquisa, pretendem representar negativamente contra o objetivo de pesquisar o conhecimento em correlações funcionais [ix].

Contra tal posicionamento defasado, cabe lembrar que explicar o fato social do conhecimento, sua eficácia dentre as regulamentações do viver em sociedade, implica reconhecer, nas referidas correlações funcionais, um procedimento diferenciado de verificação dos determinismos, a que o sociólogo não deve faltar.

De modo semelhante à história, a sociologia é uma disciplina complexa, não dirigida para os fins práticos adotados nas ciências sociais particulares, mas orientada para pôr em relevo o que é de difícil acesso, justamente os determinismos sociais, como operações de integração dos fatos particulares nos conjuntos práticos.

Por sua vez, a sociologia do conhecimento se constitui e se impõe como disciplina científica na medida em que estabelece um método para (a) explicar a variedade dos conteúdos cognitivos, e, por essa via, (b) desenvolver uma classificação compreensiva dos mesmos, (c) com aplicação para descrevê-los [x].

As observações e comentários reunidos na presente obra exploram e projetam, justamente, as referidas correlações funcionais em escala do pluralismo social efetivo, tendo em vista pôr em relevo, a partir da reciprocidade de perspectiva, os procedimentos dialéticos de intermediação na realidade social, incluindo as complementaridades, as implicações mutuas, as ambiguidades, as polaridades.

Quando se fala de conhecimento socialmente efetivo, em sociologia, devem ter em vista como disse que nenhuma comunicação pode ter lugar fora do psiquismo coletivo (as consciências são intercomunicadas). Todo o conhecimento é comunicável (pelos mais diversos simbolismos sociais) e a língua é somente um meio para reforçar a interpenetração e a participação em um todo (o Nós-outros).

O chamado “estruturalismo” liga-se à concepção discursiva que reduz a consciência coletiva a uma simples resultante das consciências individuais isoladas, tidas como ligadas entre si pelas suas manifestações exteriores nos signos e nos símbolos – Claude Levy-Strauss, por exemplo, trata a consciência coletiva como resultante de consciências individuais ligadas na linguagem como signo exterior da fala [xi].

Insistem os autores dessa tendência de interpretação alegorista, impropriamente chamada “estruturalista”, na importância do critério da linguagem como fato, mas, ao invés de acentuar a união prévia, o todo existente (o Nós-outros) que torna possível a apreensão dos significados comuns de uma língua, tomam as manifestações exteriores de signos e símbolos em uma estrutura a que, supostamente, as consciências individuais isoladas seriam ligadas em lógica, e não em consciência coletiva. Afirmam, por exemplo, que, se há linguagem, seria supostamente lógico que possam comunicar.

Portanto, o questionável aqui é tal pressuposição discursiva da existência de um estruturalismo lógico universal na base de toda a sociedade.  Um artifício que, desprovido de profundidade, acolhe sem crítica e de maneira alegórica ou inconsciente as preconcepções filosóficas do século XVIII. Agasalha, notadamente, a ideia de um “Eu genérico”, representado tanto na “vontade geral” de Rousseau quanto na “intuição transcendental” de Kant.

Como observou Bourdieu[xii], Lévy-Strauss é censurável por “incluir” o princípio da relação (ou correlação) entre as estruturas dos sistemas simbólicos e as estruturas sociais dentre as explicações demasiado fáceis e ingenuamente projetivas, que ele mesmo passou a rejeitar em favor das interpretações alegóricas.

Desta forma, pode ver que a orientação aqui elaborada não é neutra, mas tem implicação crítica, se contrapõe aos preconceitos filosóficos inconscientes.

Em suma, o presente trabalho elabora algumas linhas de análise e interpretação aplicáveis para situar, em nível de introdução, os problemas significativos de sociologia que abrem o caminho para a compreensão dos sistemas cognitivos.

 

Rio de Janeiro, junho 2008 / março de 2017

 

[1] Pelo caráter de coletânea, algumas repetições escapam à revisão.

[2] http://www.oei.es/historico/cienciayuniversidad/spip.php?article6374

[i] Cf. “A Vocação Atual da Sociologia, vol. I: Na Senda Da Sociologia Diferencial ”,tradução da 4ª edição francesa de 1968 por Orlando Daniel, Lisboa, Cosmos, 1979, 587 págs. (1ª edição em Francês: Paris, PUF, 1950),  pp. 109 sq.

[ii] VER NOTAS COMPLEMENTARES.

[iii] Sobre o posicionamento de Durkeim a respeito das funções cerebrais na vida da consciência: Lumier, Jacob (J.): “O Conhecimento na Realidade Social”, http://www.oei.es/historico/cienciayuniversidad/spip.php?article6374, p 29 / 30.

[iv] Bourdieu, Pierre: “A Economia das Trocas Simbólicas”, introdução, organização e seleção dos originais em Francês por Sérgio Miceli, São Paulo, ed. Perspectiva, 1974, 361 pp.

[v] Gurvitch discute o desafio da desdogmatização como a questão do alcance da dialética complexa. Cf. Gurvitch Georges (1894 – 1965): “Dialectique et Sociologie”, Paris, Flammarion, 1962, 312 pp., col. Science.

[vi] VER NOTAS COMPLEMENTARES

[vii] É equivocado identificar as teorias de consciência aberta à filosofia fenomenológica e reduzi-las unicamente à influência de Edmund Husserl.

[viii] Wright Mills, C.: ‘Consecuencias Metodológicas De La Sociología Del Conocimiento’, in Horowitz, I.L. (organizador): ‘Historia Y Elementos De La Sociología Del Conocimiento – Tomo I’, artigo extraído de Wright Mills, C.: ‘Power, Politcs And People’, New York, Oxford University Press, 1963; tradução Noemi Rosenblat, Buenos Aires, Eudeba, 3ªedição, 1974, pp.143 a 156.

[ix] Como podem ver no livro editado por Gunter W. Remmling: “Towards the Sociology of Knowledge”, Londres, Routledge and Kegan Paul, 1973, 457 pp. Cf. págs. 289, 290.

[x] Sobre os desafios postos para a sociologia do conhecimento, ver meus trabalhos de 2013, intitulados “Curso de Sociologia do Conhecimento”, em três volumes seguintes: “Texto 01, 02 e 03”, respectivamente.  Links: http://www.bubok.es/libros/226411/Curso-de-Sociologia-do-Conhecimento–Texto-01 ; http://www.bubok.es/libros/227287/Curso-de-Sociologia-do-Conhecimento–Texto-02; http://www.bubok.es/libros/229246/Curso-de-Sociologia-do-Conhecimento–Texto-03

[xi] Da mesma maneira discursiva, há quem veja as consciências individuais ligadas (a) no direito, como símbolo projetando a crença na solidariedade ou as representações coletivas dessa crença; (b) no totem religioso das sociedades arcaicas, como símbolo (bandeira ou emblema) de um clã arcaico, seu signo exterior.

[xii] Cf. Bourdieu, Pierre: “A Economia das Trocas Simbólicas”, introdução, organização e seleção dos originais em Francês por Sérgio Miceli, São Paulo, ed. Perspectiva, 1974, 361 pp., pág.33.

Posted in classes sociais, comunicação social, conhecimento, conhecimentos coletivos, conhecimentos universitários, consciência, consciência coletiva, desarrollo, desejável, desenvolvimento, dialética, e-books; ciências humanas; formação., ensino, epistemologia, estratificação, estratificacion, Estudos Críticos; Sociologia., formação, Gurvitch, história, homo faber, ideologia, juízos, lógica, linguagem, Max Weber, mentalidade, metodologia científica, microfísica, microssociologia, modernização, moralidade, motivação, movimentos sociais, mundo do trabalho, mundo dos valores, mundo moderno, neoliberalismo, papéis sociais, públicos, pesquisa, pesquisa científica, pluralismo, política, problemas sociológicos, psicologia coletiva, psiquismo coletivo, questões públicas, realidade social, realismo, reificação, relações humanas, relativismo científico, representação de interesses, Revolução de Heisenberg, Saint-Simon, Sartre, século vinte, século XIX, sentimento coletivo, sistemas cognitivos, sistemas simbólicos, sociabilidade, social, sociólogo, sociedade, sociologia, sociologia do conhecimento, sociologists, sociology, solidariedad, solidariedade, subjetividade coletiva, técnica, tecnificação, tecnologia, temas coletivos, teoria da relatividade, teoria de coação, teoria sociológica, TICs e Educação, Uncategorized, utilitarismo, valores, variabilidade, vida moralTagged classes de conhecimento, classes sociais, conceito de estrutura, correlações funcionais, determinismos sociais, ensino-de-sociologia, estratificação social, estrutura de classes, experiência sociológica, formas de conhecimento, história, mentalidades, microssociologia, problemas de sociologia, psiquismo coletivo, quadros sociais, sociologia do conhecimento, subjetividade coletiva, teoria sociológica, tipo de estruturaLeave a comment

Sociologia para a Mentalidade dos Direitos Humanos: Apresentação

Posted on April 8, 2017April 8, 2017 by Jacob (J.) Lumier

 

Apresentação e Introdução do livro

Sociologia-para-a-Mentalidade-dos-Direitos-Humanos

Texto Base para uma oficina de sociologia e ensino 

 

Por

Jacob (J.) Lumier

Autor de Ensayos Sociológicos con trabajos difundidos en la Web de la Organización de Estados Iberoamericanos para la Educación, la Ciencia y la Cultura – OEI y junto a la página del Ministerio de Educación de Brasil (Domínio Público)

 

 

 

Websitio Produção Leituras do Século XX

http://www.leiturasjlumierautor.pro.br

 

Río de Janeiro / RJ, Brasil, julho 2016

 

 

 

Epígrafe

 

 

Algumas pessoas formam uma ideia equivocada de que, se os outros conquistam direitos, elas irão perder o que acreditam ser seus direitos, mas que, em realidade, são uns privilégios. Os direitos humanos são uma prática de vida, um estado da mente. À criança se deve ensiná-los desde a primeira infância.

(Margarida Genevois, socióloga).

 

 

 

Sociologia para a Mentalidade dos Direitos Humanos

Jacob (J.) Lumier

 

 

Sumário

Apresentação 1

O elemento da solidariedade internacional 1

Caráter indispensável do WPHRE 1

O direito de saber 1

A falsa alternativa da moral e da política 1

A falsa orientação sobre o Estado Nacional 1

Primeiro Ponto: as sociedades democráticas 1

O problema dos valores 1

A Experiência Moral na liberdade efetiva 1

A elevação libertadora 1

O problema da liberdade intelectual 1

Dialética entre a consciência individual e a coletiva 1

Juízos de realidade, Juízos de valor e Variabilidade 1

Segundo Ponto: 1

O Caráter Histórico dos Direitos Humanos 1

(…)

 

 

 

 Apresentação

Sociólogos sem Fronteiras Rio de Janeiro – SSF / RIO está cumprindo seu segundo ano de expressão. Nosso perfil se mostra mais afirmativo, onde nos encontramos com o nosso compromisso em promover e desenvolver as atividades pedagógicas no campo da Sociologia e Direitos humanos.

A presente publicação visa contribuir com material para uma oficina de sociologia e para o ensino, em conformidade com nossa orientação já proporcionada na página principal da Web de SSF / RIO, inclusive as postagens e os eBooks lá relacionados.

Para os sociólogos sem fronteiras, abraçar a causa dos direitos humanos significa, simplesmente, ajudar os que deles necessitam, seja porque não os desfrutam ou porque os tenham gravemente cerceados. Os sociólogos estão especialmente dotados para isso, ao ser a profissão que tem grande informação sobre os determinismos sociais e uma metodologia de análise muito depurada. O passo seguinte, comprometer-se com essa causa, resulta quase inevitável, sem necessidade de amparar-se em definições políticas prévias.

A Educação é essencial para a realização dos direitos humanos e as liberdades fundamentais – compreendidas especialmente na primeira geração –, e contribui significativamente para promover a igualdade, prevenir os conflitos e as violações, e fomentar a participação e os processos democráticos. A longo prazo, todas as pessoas aprendem a ser tolerantes, a respeitar a dignidade dos demais e os meios e arbítrios de assegurar esse respeito em todas as sociedades.

O apelo histórico da Conferência Mundial de Direitos humanos, celebrada em Viena em 1993, insta a todos os Estados e instituições que incluam os direitos humanos, o direito humanitário, a democracia e o Estado de Direito como temas dos planos de estudos de todas as instituições de ensino.

 

***

Introdução: Sociologia e Direitos humanos

O presente artigo é uma forma de cooperação junto aos atuais esforços da sociedade democrática em participar do programa mundial para a Educação em direitos humanos (WPHRE) [[i]].

Tem por objetivo esboçar algumas linhas de reflexão sobre os conteúdos de sociologia e direitos humanos, para desenvolvimento em uma oficina de sociologia e em um curso de formação.  Visa a aplicação na questão da diferença em face dos temas ideológicos, a que examina sob os aspectos seguintes: (a) em torno do problema do individualismo no Século XX, em relação ao qual, erroneamente, alguns publicistas acusam a presumida ligação dos direitos humanos, em razão desses últimos, inicialmente, centrarem seu foco no indivíduo; (b) em referência ao impacto das técnicas de informação e comunicação – TICs, que não somente potencializam a indispensável liberdade de expressão, mas põem em relevo a difusão dos direitos humanos e suas violações.

Obviamente, o método utilizado nesse trabalho é uma aplicação da sociologia, e consiste em situar a matéria no marco da realidade social e histórica. Nada obstante, essa orientação não significa privilegiar a conhecida classificação em três gerações de direitos humanos, preferida por muitos sociólogos, em detrimento do enfoque multidimensional.

O elemento da solidariedade internacional

Pelo contrário. Desde o ponto de vista do pluralismo efetivo da realidade social, diferenciado em escalas, quadros sociais e procedimentos dialéticos, o aspecto multidimensional dos direitos humanos em sua interpenetração, afirmando-se uns pelos outros, não poderia permanecer em segundo plano.  A multidimensionalidade implica o elemento da solidariedade internacional, posto em foco pela terceira geração dos direitos humanos ao abranger os direitos que avançam mais além do âmbito civil e social. Ademais, conta, igualmente, o amplo espectro dos direitos grupais e coletivos, os quais, dentre outros, propugnam a consecução de um nível de vida adequado.

Junto aos tópicos debatidos aqui, se observou que a era das tecnologias da informação e comunicação – TICs favorece a tendência para a retomada do utilitarismo, como doutrina de recorte moral, e que esse fato deve ser levado em conta como obstáculo no estudo dos direitos humanos desde o ponto de vista sociológico.

Basta lembrar que, igualmente aos adeptos do atomismo, no utilitarismo prevalece a visão da sociedade feita unicamente de indivíduos para a realização de fins que são primariamente os fins individuais, o que leva a reencontrar a proposição conservadora de que “não há tal coisa como uma sociedade”, e, por extensão, nada do direito internacional à solidariedade [[ii]].

 

Caráter indispensável do WPHRE

 

Caráter indispensável de um programa educativo como o Programa Mundial para a Educação em Direitos humanos / World Programme for Human Rights Education (WPHRE) diante do impacto pró utilitarismo doutrinal resultante das TICs.

 

Em consequência, desse impacto para o utilitarismo doutrinal resultante das TICs, podem ver claramente o status indispensável de um programa educativo como o aludido Programa Mundial para a Educação em Direitos humanos / World Programme for Human Rights Education – WPHRE [[iii]].  Trata-se de fomentar a tomada de consciência e promover, junto ao jornalismo e aos meios de comunicação, a vinculação aos direitos humanos. Desiderato tanto mais estimado quanto as formas de participação social, no contexto de uma era de tecnologias de informação e comunicação – TICs, passam por um modelo de compartilhamento [[iv]].

Sem embargo, na medida em que o utilitarismo doutrinal e o atomismo social podem servir de cobertura e justificação para as posições pró mercadorização das relações sociais [[v]] – que é uma serventia claramente prejudicial à universalização dos direitos humanos – revela-se uma situação igualmente desfavorável aos titulares de direitos, e à percepção dos comportamentos e representações geradoras de violações, inclusive as imagens depreciativas de outros [[vi]].

Como sabem, no contexto das desigualdades sociais, muitas pessoas têm uma ideia equivocada de que, se os outros estão a lograr direitos, irão elas perder o que creem ser seus direitos, mas, em verdade, são privilégios. Em consequência, nota-se a relevância da crítica psicossociológica, tanto mais indispensável quanto as imagens depreciativas permanecem dissimuladas ou disfarçadas nas hierarquias sociais combinadas com a distribuição compulsiva de vantagem competitiva [[vii]].

O direito de saber

Seja como for, na medida em que o direito de saber é um requisito para a liberdade de pensamento e de consciência, assim como a liberdade de pensamento e a liberdade de expressão formam as condições necessárias para a liberdade de acesso à informação, podem dizer que a Educação em direitos humanos se desenvolve basicamente na liberdade de expressão e reunião.

A falsa alternativa da moral e da política

Por último, o tópico no qual a miúdo se debate a questão de saber se os direitos humanos são de matiz moral ou têm coloração político ideológica é um plano complexo, que também tem seu lugar neste artigo, porém com poucas linhas, já que essa alternativa da moral ou da política deixa de existir uma vez admitido que a ação na qual os organismos do Estado de Direito estão participando e estão promovendo é a ação pública, cujo marco de referência é a sociedade democrática e não o aparato do Estado [[viii]]

Isto significa que, em lugar dos temas ideológicos – como, por exemplo, o papel do Estado nacional (sobreposto ao Estado de Direito), a participação nos partidos políticos, etc. –, os temas coletivos reais, inclusive as relações com os outros, com os grupos, classes,  sociedades globais, devem ser postos em relevo, já que são esses temas coletivos e não os primeiros, que trazem consigo os obstáculos reais à universalização dos direitos humanos, tais como as desigualdades sociais, a degradação do meio ambiente, os desastres ambientais – inclusive as guerras, os eventos naturais e os de saúde pública –, e a necessidade de saneamento.

Por sua vez, essa referência aos elementos da sociedade democrática emerge com força desde a perspectiva de aprofundamento da educação em direitos humanos, a qual, ademais dos sistemas de ensino de primeiro, segundo e terceiro graus, é orientada para a capacitação de professores e funcionários públicos, incluídos os militares, e alcança os jornalistas e profissionais dos meios de comunicação.

Tendo em vista essa dimensão transversal corretamente desenhada no mencionado Programa Mundial para a Educação em Direitos humanos / World Programme for Human Rights Education – WPHRE , já podem compreender que, como consequência disso, o fator que imprime o conteúdo dos direitos humanos não é primordialmente um elenco de medidas com a mesma maneira (recursos técnicos e articulação de interesses) das que se aplicam geralmente para pôr em obra, por exemplo, uma estratégia diferenciada de ação económica para o desenvolvimento, ainda que as metas respeitem e valorem a população civil de baixos ingressos, como é amplamente desejável. Porém, o fator que imprime o conteúdo dos direitos humanos suscita, como primordial, a tomada de consciência dos obstáculos efetivos à universalização. Em decorrência, nota-se a relevância da sociologia e da psicologia coletiva que ela traz, na prática de caráter pedagógico que, então, se delineia.

A falsa orientação sobre o Estado Nacional

Por sua vez, a tentativa exagerada em reduzir o desafio de promover a universalização dos direitos humanos à questão ideológica do papel do Estado Nacional, tem pouco aproveitamento quando se trata de comportamento e consciência coletiva.

Em verdade, ao desprezarem o potencial das novas formas de participação social suscitadas pelas TICs, vários publicistas desacreditam a possibilidade de universalização dos direitos humanos (com a redução das violações em escala global) y, em razão desse ceticismo, sustentam, equivocadamente, que a atuação estatal na promoção, garantia e reparação dos direitos humanos, ao desenvolver-se como somente mais uma das políticas públicas, deveria servir aos ditames do pensamento ideológico do grupo do governo.

Aventa-se, nesse caso, uma falsa orientação, que não é mais do que uma mistificação das teorias de hegemonia. Com efeito, ainda que integrados no domínio jurídico interno dos Estados membros das Nações Unidas, os direitos humanos procedem dessas últimas, como blocos de sociedades globais, e, por essa razão, constituem fator de apaziguamento dos grupos e de reconhecimento das populações civis. Ademais, se mostram historicamente arraigados nas intermediações das sociedades democráticas, e não há maneira de utilizá-los para fins distintos de sua universalização. Na hipótese contrária, se perderá a liberdade intelectual e de expressão que é crítica para os mesmos.

O presente artigo, ao revalorizar as atividades da sociedade democrática que contemplam o psiquismo coletivo, como a mencionada liberdade intelectual e de expressão (inclusive as ações pedagógicas), põe em relevo a diferença dos direitos humanos e a especificidade transversal de seus temas, que não devem confundir aos temas ideológicos, posto que os temas de direitos humanos não servem de trampolim para os projetos de poder e hegemonia.

Dirigido para a cooperação com o mencionado programa mundial para a Educação em direitos humanos, neste trabalho se compartilha a compreensão de que, como procedimento eficaz na universalização, a Educação nessa área contribui a combinar os programas e políticas de direitos humanos, por um lado, e as ações pedagógicas, por outro lado.

***

 

 Primeiro Ponto: as sociedades democráticas

 

Antes de qualquer premissa de pensamento ideológico e interesse do Estado, é indispensável manter o foco na complexidade da experiência humana, para abraçar a causa dos direitos humanos proclamados nos três atos fundamentais das Nações Unidas seguintes: (1) – Declaração Universal dos Direitos humanos  /  Universal Declaration of Human Rights – UDHR, adotada em 1948; (2) – Convenção Internacional de Direitos Civis e Políticos / International Covenant on Civil and Political Rights – ICCPR, 1966; (3) – Convenção Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais / International Covenant on Economic, Social, and Cultural Rights- ICESCR, também de 1966.

A crítica exagerada de que os direitos humanos perpetuam o individualismo ou a moral individualista deixa de lado as diferenças específicas, e trata de projetar uma identificação errónea dos direitos humanos com a ideologia neoliberal. Entretanto, tal diferença existe, e pode ser resumida na seguinte observação: o fato de que as pessoas tenham interesse próprio quando participam nas relações sociais não significa a busca do lucro, não significa que estão lá para ganhar mais dinheiro. Esse interesse expressa sua aspiração ao bem-estar e pode ser o desejo de realizar obras, participar e ampliar seus conhecimentos e experiências.

A moralidade individualista não é um mal em si. Tampouco o fato de que os direitos humanos fortalecem o indivíduo como foco de aspirações aos valores não significa uma imposição do individualismo, como pilar de algum projeto de hegemonia cultural, algum existencialismo, socialismo não coletivista, e muito menos neoliberalismo.

Ainda que possam descobrir ali orientações filosóficas, não há nenhuma doutrina de antemão que enquadre estrategicamente a Declaração Universal dos Direitos humanos –   UDHR em um projeto de hegemonia. Existe somente o compromisso internacional e a atitude solidária das sociedades democráticas em promover, assegurar, reparar os direitos humanos proclamados pelas Nações Unidas.

Assim, pode ler no Preâmbulo da referida UDHR, o seguinte: “A Assembleia Geral proclama a presente Declaração Universal de Direitos humanos como ideal comum pelo qual todos os povos e nações devem esforçar-se, a fim de que, tanto os indivíduos quanto as instituições, inspirando-se constantemente nela, promovam, mediante o ensino e a Educação, o respeito a esses direitos e liberdades, e assegurem, por medidas progressivas de caráter nacional e internacional, seu reconhecimento e aplicação universais e efetivos, tanto entre os povos dos Estados membros quanto entre os dos territórios colocados sob sua jurisdição.

O problema dos valores

(Em uma leitura sociológica)

 

Sem embargo, permanece o fato de que, ao fortalecer o indivíduo como aspiração aos valores, os direitos humanos põem em perspectiva uma ou várias moralidades individualistas, e, por essa via, seria compatível ou, inclusive, favoreceria a algum existencialismo, socialismo não coletivista, neoliberalismo. Poderia ser assim, talvez, se os valores proclamados não houvessem sido reconhecidos, em modo justo, em função da liberdade humana eficaz.

Esse ponto é irredutível, e se sobrepõe a toda a representação de que os direitos humanos possam servir de antemão a uma orientação de hegemonia cultural. Para compreender essa irredutibilidade, é suficiente prestar atenção ao referido Preâmbulo da Declaração Universal de Direitos Humanos / Universal Declaration of Human Rights – UDHR, cujo parágrafo segundo põe em foco as liberdades essenciais [[ix]], que se afirmam de elas próprias na experiência humana e na base de todos os valores reconhecidos nos direitos humanos tomados em conjunto, a saber: a liberdade de falar e crer e a liberdade de não temer e querer / freedom of speech and belief and freedom from fear and want.

Nesse sentido de liberdade humana consciente, deve ter em conta que, antes de qualquer orientação metamoral (Kant, Hegel, Spinoza, Durkheim), em que um mundo espiritual se realiza no mundo temporal [[x]], o problema dos valores desde o ponto de vista da sociologia – os valores em obras de civilização [[xi]] – são incluídos como os escalões que dirigem a elevação libertadora.

A Experiência Moral na liberdade efetiva

Desde o ponto de vista sociológico assim entendido, o conhecimento dos critérios morais se torna concreto, como reflexão posterior sobre o ato moral diretamente vivido, implicando os valores vislumbrados no calor da ação mesma. Além de não se enquadrar em nenhuma doutrina prévia, essa ação moral criadora de seus próprios critérios está em direta oposição a qualquer filosofia da história, e à crença no progresso automático, com o acréscimo de que a especificidade da experiência moral assim efetuada se verifica exatamente como reconhecimento, isto é, ação participativa nos distintos graus do esforço coletivo (entendido este último como tentativa de realização), ou, em uma sentença, “ a vontade com os olhos abertos nas trevas” [[xii]].

 

A elevação libertadora

Na leitura sociológica, a base dessa experiência moral específica é a teoria da intuição da vontade guiada por suas próprias luzes, a que se pode chegar por meio da concepção dinâmica de toda a moralidade efetiva, em três níveis em profundidade ou escalões (paliers): (a) como superação contínua do adquirido; (b) como recriação permanente dos Nós-outros e de outros; (c) como moralidade de ação e de aspiração participando na liberdade criadora pelo próprio esforço incessante dos Nós-outros [[xiii]]

Trata-se de concepção dinâmica resumida na seguinte fórmula de Henri Bérgson (1859-1941): < para que a consciência se distinguisse do ‘já feito’ e se aplicasse ao que ‘se está em vias de fazer’ seria necessário que, retornando-se e retorcendo-se sobre si, a faculdade de ver constituísse uma única unidade com o ato de querer >. Na ação livre, ao lançar-se para adiante, se tem a consciência dos motivos e dos móveis em via de se tornarem ambos idênticos [[xiv]].

Essa teoria da intuição da vontade é não somente a base da especificidade da experiência moral, mas o que caracteriza essa especificidade é a própria liberdade consciente. Vale dizer, assim como há diferentes espessuras da duração e variada intensidade da liberdade, há igualmente diferentes graus de vontade consciente, a qual se faz cada vez mais livre, entra em elevação libertadora, na medida em que: (a) vai mais além da eleição entre as alternativas, por exercício da decisão; (b) supera a própria decisão voluntária, mediante o exercício da vontade propriamente criadora.

Desta forma, a moral de criação que é possível tirar de Bérgson, encontra fundamento para prosseguir sua realização nos referidos escalões ou patamares (paliers) em profundidade da realidade social. É a liberdade situada no miolo da vida humana consciente [[xv]].

Para compreender melhor o problema dos valores, tomados como escalões que dirigem a elevação libertadora, devem ter em conta que, sendo o desejo uma tendência (para a realização) expressa na obras de civilização, a vontade por sua vez não é mais do que a mesma tendência acompanhada da consciência: o desejo e a vontade não se pode pô-los em oposição um à outra, como nas filosofias metamorais, isso em razão de que eles não são mais do que graus do mesmo processus de realização, de tal sorte que há entre eles uma gradação dos níveis intermediários.

 

O problema da liberdade intelectual

Toda a pessoa tem o direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a liberdade de defender opiniões sem interferência e de buscar, receber e difundir informações e ideias por qualquer meio de comunicação e sem consideração de fronteiras. /  Everyone has the right to freedom of opinion and expression; this right includes freedom to hold opinions without interference and to seek, receive and impart information and ideas through any media and regardless of frontiers. (Art. 19  UDHR)  [[xvi]].

Trata-se da liberdade de expressão em seu sentido mais efetivo, como liberdade intelectual – para recordar o conceito desdogmatizador de Spinoza [Baruch Spinoza, 1632 – 1677] –, liberdade exercida com anterioridade histórica aos mass media e não com dependência deles. Quer dizer, a liberdade de expressão orientada para o efetivismo, como elemento das liberdades, como o caráter humano das liberdades [[xvii]]; o efetivismo tal como se diferencia lá onde vem a ser afirmada a concepção dinâmica da experiência moral.

Desta forma, em paralelo com a anteriormente referida teoria da intuição da vontade, Spinoza, pensador da liberdade intelectual, guarda interesse para o sociólogo [xviii]. Pode dizer que o jusnaturalismo desse pensador avançou na antecipação das liberdades essenciais, que se afirmam delas próprias antes de toda a projeção e representação, às quais todo o humano chega na sua experiência e por sua experiência.

Ao conceber que a liberdade intelectual é absoluta e não pode ser refreada nem restringida desde o exterior, o filósofo deixou uma referência para a ética racional que Max Weber muito apreciou. Por outras palavras, somente a moralidade racional investida do tipo prudente e sábio dispõe das condições indispensáveis para conter a progressão absoluta da liberdade intelectual, perante um soberano tido como incapaz de manobrar contra ela ou de lhe definir os seus ambientes. Por sua vez, superar o jusnaturalismo implica compreender as funções intelectuais, a fim de situar adequadamente a liberdade efetiva.

De fato, a referência das funções intelectuais está bem marcada na sociologia do conhecimento, que põe em relevo a diferenciação entre, por um lado, o plano dos estados mentais – inclusive as representações e a memória, assim como as opiniões coletivas [[xix]] – e, por outro lado, a intervenção dos atos mentais, sejam coletivos sejam individuais. Notem que, no solo dessa diferenciação, os atos são: (a) as experiências mais ou menos imediatas, cujos casos limites são as intuições intelectuais, que fazem participar diretamente no real; (b) os juízos.

Notem que ambos, experiências intuitivas e juízos, são as manifestações as mais intensas da consciência aberta às influências do ambiente, e se pode dizer que os atos mentais se manifestam na implicação mútua entre as experiências de participar no real e os juízos dessa maneira tornados cognitivos, dos quais as atitudes, como disposições para reagir, são os focos primários [[xx]]. A liberdade implicada nos atos individuais e coletivos que estruturam e desestruturam a realidade social é a liberdade humana – não metamoral, nem realização terrestre de um mundo espiritual –, de que a liberdade intelectual é um aspecto, e se afirma como escolha, decisão, criação.

O psicologismo individualista é equivocado ao preconizar que, no nível psicológico da realidade social, qualquer interesse estivera concentrado na psicologia interpessoal, em detrimento da psicologia coletiva propriamente dita. Trata-se de um individualismo equivocado que despreza as funções intelectuais e voluntárias, com uma orientação limitada ao aspecto exclusivamente emotivo e, neste, ao aspecto da preferência e da repugnância, deixando erroneamente de lado o aspecto mais significativo da aspiração.

Em teoria sociológica, se sabe que (a) toda a consciência é não somente uma tensão virtual do fechado até o aberto, mas é também uma tensão entre as múltiplas sensações e sua integração nas totalidades; (b) por sua vez, ao fazer ver que as sensações particulares não são mais do que abstrações  intelectuais de totalidades apreendidas intuitivamente, a teoria psicológica da forma, Gestalttheorie, demonstra a impossibilidade na redução da consciência às sensações dispersas – redução imprópria essa que, já observou Gurvitch [[xxi]], houvera reforçado a concepção da consciência individual fechada (introspectiva) em Durkheim.

 

Dialética entre a consciência individual e a coletiva

Nada obstante, o sociólogo afirma a evidência de que existem os elementos sensíveis da consciência coletiva: há os sentidos coletivos de conservação e defesa, os sentidos das paixões e de inclinações coletivas e, por sua vez, é evidente a existência das funções intelectuais na consciência individual (estados, opiniões, atos).

Ademais, Durkheim insiste sobre as tendências, os sentimentos, as crenças, as aspirações, as efervescências coletivas, que podem referir-se aos estados e às opiniões, tanto quanto aos atos mentais e às funções intelectuais (juízos), mas que, em todos os casos se opõem à razão universal das metamorais.

Quer dizer, o sociólogo põe em relevo que, no aspecto da dupla existência de elementos sensíveis e das funções intelectuais, há dialética entre a consciência individual e a consciência coletiva – há tendência à complementariedade, à participação mutua e à reciprocidade de perspectiva. Desta sorte, o referido dualismo de elementos sensíveis e de funções intelectuais é observado tanto na consciência individual quanto na coletiva.

Acresce que, de acordo com Gurvitch, as consciências individuais podem interpenetrar-se e fundir-se, (a) por vezes, em suas sensações e paixões; (b) por vezes, em suas representações e seus sentimentos; (c) por vezes, em seus atos, em suas intuições e em seus juízos, sejam esses marcados pela preponderância da inteligência, da emoção ou da vontade.

 

Juízos de realidade, Juízos de valor e Variabilidade

Nos direitos humanos, não logram as ilusões aportadas pela confusão com a filosofia da história, as quais se encontram favorecidas pela ocorrência de um erro lógico fundamental, que é a falta de diferenciação entre os juízos de realidade e os juízos de valor. De esse erro resulta a confusão, seguinte: em vez de explicar os desejos a partir da realidade social, constroem a realidade social em função desses desejos.

Os juízos de valor são as aspirações, os desejos e as imagens ideais do futuro, e conformam um dos escalões da realidade social, de tal sorte que o progresso em direção a um ideal (filosofia da história) somente poderá intervir na análise sociológica unicamente em vista de integrar esse progresso ideal em um conjunto de fatos sociais que a análise se propõe explicar.

A sociedade está sujeita às flutuações e até mesmo aos movimentos cíclicos. Tomado como um movimento constante, o progresso retilíneo em direção a um ideal particular não pode aplicar-se mais do que em relação a certos períodos, em outros períodos a sociedade pode orientar-se em sentido oposto ao ideal ou por um ideal completamente diferente.

A falta de diferenciação entre os juízos de realidade e os juízos de valor torna impossível o acesso da análise sociológica a um dado fundamental da vida social que é a variabilidade. Aliás, não é somente esta última que torna insustentável a representação de que os direitos humanos são previamente favoráveis às ideologias e moralidades individualistas. Deve ter em conta (a) a tendência histórica efetiva para a universalização dos direitos humanos [[xxii]], e (b) o fato de que os direitos humanos estão imbricados nos quadros sociais reais, (b1) tais como as formas de sociabilidade – inclusive a fusão parcial das prerrogativas de uns com as obrigações de outros – e (b2) os agrupamentos sociais particulares.

Com efeito, a sociologia diferencial tem por básico que os agrupamentos particulares mudam de caráter e não somente de posições, assumem identidades e diferenças não assumidas em diferentes tipos e subtipos de sociedades. Ademais, na medida em que participam da mudança em eficácia que se opera no interior das estruturas, os grupos, mais do que se deslocarem conforme trajetórias exteriores, se movem nos tempos sociais [[xxiii]].

Da mesma maneira, a variabilidade pode ser observada no seguinte: (a) os indivíduos mudam de atitude em função dos grupos aos quais pertencem. Para ver tal situação, basta atentar para o fato de que os grupos são formados exatamente com base na continuidade e no caráter ativo de uma atitude coletiva; (b) os papéis sociais que os indivíduos assumem ou os personagens que encarnam mudam segundo os círculos sociais diferentes a que pertencem. Desta sorte, um pai ou um marido muito autoritário, por exemplo, pode simultaneamente desempenhar o papel de um colega particularmente atencioso, etc.; (c) em cada grupo, um indivíduo desempenha um papel social diferente: por um lado, é mecânico ajustador, vendedor, professor, etc., por outro lado, esse mesmo indivíduo pode desempenhar nesses grupos papeis umas vezes sem brilho outras vezes brilhantes; umas vezes subordinados outras vezes dominantes. Ademais, segundo as estruturas e conjunturas sociais variadas, os mesmos indivíduos e os mesmos grupos podem desempenhar papeis muito diferentes e até opostos.

 

 

Segundo Ponto:

O Caráter Histórico dos Direitos Humanos

(Crescimento dos Direitos Humanos)

 

Alguns autores dizem que compreender os direitos humanos no marco da experiência humana seria superestimar o Iluminismo europeu do século XVIII, como sua fonte de inspiração e, por essa via, relacioná-los com anterioridade às doutrinas do empirismo e do pragmatismo, como principais quadros de referência. Sem embargo, sabe que esta objeção carece de fundamento e não tem lugar. Ou melhor, só terá alcance se o comentarista se unir ao pensamento doutrinal, seja jurídico, ético ou estatal, orientação que escapa ao enfoque por via da realidade social, que, por sua vez, delimita a mirada do sociólogo.

A abordagem pela experiência ou multidimensionalidade não implica deixar de lado a conhecida compreensão e classificação das gerações de direitos. Pelo contrário. Essa última ressalta o caráter social histórico dos direitos humanos, de que o enfoque multidimensional não pode prescindir.

As gerações de direitos são um marco operativo tripartido que, em primeira geração, delineia os direitos civis e políticos, os quais garantem a liberdade; em segunda geração, diferencia os direitos económicos e sociais, os quais promovem a igualdade, e, por fim, o grupo de terceira geração, com os direitos culturais, os quais apoiam a solidariedade.

Em geral, há quem expresse ceticismo acerca da perspectiva de universalização dos direitos humanos [[xxiv]]. Sem embargo, na construção de uma orientação não eurocêntrica, a universalização dos direitos humanos segue sendo uma aspiração válida, inclusive para aqueles que valoram a variedade cultural.

De todos os modos, a trajetória de três gerações de direitos está marcada por uma série de problemas teóricos, incluindo o risco de atomismo, o eurocentrismo, e a inexatidão histórica, problemas que estão a girar em torno de certos termos opostos, tais como universalismo contra o particularismo, os direitos negativos diante dos direitos positivos, os direitos individuais diante dos direitos coletivos  [[xxv]].

Em relação a tais dificuldades, deve assinalar duas inovações [[xxvi]] no pensamento dos direitos humanos: (a) o conceito de indivisibilidade, segundo o qual os direitos civis e políticos, os direitos económicos e sociais, os direitos dos grupos e os direitos culturais são fundamentalmente inseparáveis uns dos outros; (b) relacionado a este, nota o conceito de agrupamento de direitos, pelo qual os direitos organicamente vinculados devem ser apresentados em pacotes que atravessam ou transversalizan as categorias convencionais.

(…)

 Veja o e-book

Sociologia-para-a-Mentalidade-dos-Direitos-Humanos

 

Notas

[i] O Programa Mundial para a educação em Direitos Humanos é fomentado pelo Escritório do Alto Comissário para os Direitos Humanos das Nações Unidas: World Programme for Human Rights Education (2005- on going).http://www.ohchr.org/EN/Issues/Education/Training/Pages/Programme.aspx

[ii] A compreensão do problema dos valores e ideais que se descobre na orientação durkheimiana está baseada na oposição ao utilitarismo doutrinário, de tal sorte que a teoria sociólogica se define contra qualquer posicionamento eudemonista (eudaemonism) nessa matéria. A recusa da “utilidade” ou especialmente do “que é utilitário” como critério último das ações humanas, e como base mensurável de analise das questões políticas, sociais e econômicas mostra-se um posicionamento crítico que fazia parte do compromisso de Durkheim [Emile Durkheim (1858 – 1917)] em defender a especificidade da realidade social e, por esta via, repelir qualquer tentativa que pretendesse estabelecer um absoluto para a vida moral com imposição aos fatos sociais. Deste ponto decorre sua orientação pela qual as principais obras de civilização como a religião, a moralidade, o direito, a arte sejam sistemas de valores culturais (por diferença dos valores econômicos) cuja validade objetiva consiste em sua referência ao nível (escalón, “palier”) de realidade mais profundo que é dos ideais. Ver Gurvitch, Georges (1894-1965): A Vocação Actual da Sociologia – vol.II: antecedentes y perspectivas,(Tradução da 3ª edição francesa de 1968, por Orlando Daniel,Lisboa, Cosmos, 1986, 567pp.[1ª ed. Paris, PUF, 1957])

   [iii] http://www.ohchr.org/EN/Issues/Education/Training/WPHRE/ThirdPhase/Pages/ThirdPhaseIndex.aspx

[iv] Como se verá adiante, o foco do modelo de compartilhamento são as redes P2P de computadores, onde cada um dos pontos ou nós da rede funciona como “cliente” e como “servidor”, permitindo partilhar serviços e dados sem a necessidade de um servidor central.

[v] A mercadorização é um conceito com largo emprego na crítica da sociedade. Neste trabalho, é utilizado para designar o controle capitalista no âmbito da psicologia coletiva, como mercadorização das relações humanas. Sem embargo, debe ter em conta que há uma tendência para a mercadorização da sociedade: “La mercaderizacción de la sociedad es la universalización de la excepción mercantil (la excepción por la cual la oferta y la demanda no se corresponden sino bajo una “asimetrización” por la que uno u otro polo sale perdiendo).”  Cf: Jorge Iacobson: “El marketing como ideología”. Internet, Revista “Bajo Control” (25/11/2010)  http://bajocontrol.over-blog.es/article-el-marketing-como-ideologia-61689499.html  (verificado en 2 de Abril 2013).

[vi] Muitas vezes as imagens depreciativas dos outros se ligam à mentalidade conformada, submissa ao que está preestabelecido, levando a uma falsa compreensão das relações humanas, de tal sorte que, ao invés de percebidos como integrantes de um Nós-outros, os outros são reduzidos ao imaginário psicologista. Desse reducionismo decorre a pouca relevância atribuida às experiências efetivas que o grupo acumulou. Ademais, muitos descartam como neglicenciável, juntamente com a sintaxe existente, o acervo (histórico) das práticas do grupo, inclusive seus modelos e procedimentos anteriormente desenvolvidos na organização produtiva (em vigor na sintaxe existente). Portanto, se aplicam aquí as observações redescobertas na fórmula atribuída ao filósofo da Roma antiga Cícero, de que, ao comentá-la, o notável sociólogo C. Wright Mills faz ver o imaginário psicologista, por sua vez descrito como interação mais ou menos lúdica de três pessoas (Cf. C.Wright e Gerth, Hans: Caráter e estrutura social: a psicologia das instituições sociais, tradução Zwinglio Dias, Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1973, 508 págs). Quer dizer, na mentalidade conformada, que é resignada à imposição das condutas preestabelecidas, as relações humanas são vistas através do filtro do imaginário psicologista e podem ser resumidas em um jogo individualista e social atomista em que três imagens pessoais recobrem a realidade social, a saber: a pessoa que alguém “pensa” ou se representa que é, a que os outros pensam que ele é, aquela que ele julga ou supõe que os outros pensam que ele seja. Note que o imaginário psicologista é reconhecido nas chamadas “discussões de relação” (DR), tidas por psicólogos como dificuldades para a autoajuda das pessoas.

Todo o domínio da psicologia individualista se resume nesse imaginário interpessoal desgarrado, com as seguintes características: (a) é um imaginário feito de avaliações arbitradas nas preferências subjetivas ou veleidades projetadas sobre os outros; (b) é feito de autoavaliações que unicamente refletem o caráter preestabelecido das regulamentações e das condutas hierarquizadas dos aparelhos organizados. Teorizado ou não, trata-se de um imaginário frequentemente supervalorado nas técnicas utilizadas nos treinamentos corporativos, inclusive os psicodramas e os sóciodramas (originalmente concebidos na sociometria de J.L. Moreno,1889 – 1974). Indiferente à realidade social que oculta de si, nesse imaginário psicologista, a consciência se mantém mais ou menos fechada sobre si, com tendência à introspecção, lança imagens ao exterior de onde as recebe, de tal sorte que essa perpétua interação de autoimagens entre indivíduos atomizados gira como uma condenação, isto é, diretamente centrada na ansiedade da natureza humana, aquém de toda a aspiração coletiva.

[vii] A tendencia utilitarista da sociologia da administração teve o mérito de haver posto em relevo a categoria economicista da vantagem competitiva como critério na descrição do sistema de desigualdades em estratos econômicos e sociais, aplicável a todas as coisas que contam pontos em um curriculum vitae y en portfolios.

[viii] Na história moderna, quando alguém fala de sociedade democrática faz recordar as cidades livres, que precipitaram o fim da Idade Média e deram força à sociedade industrial nascente, estudada esta última por Saint-Simon (Claude Henri de Saint-Simon, 1760 – 1825), o fundador da sociologia. O bloco histórico das cidades, com sua sociabilidade característica (gira em torno da produção fabril e do comércio), e mais amplamente os conjuntos dos agrupamentos de localidades (municípios, distritos, comarcas, etc.), tais como articulados ou pactados nas várias instâncias da história das instituições parlamentares, formam em realidade social a sociedade democrática.

[ix] A expressão liberdades humanas essenciais foi introduzida pelo presidente Franklin D. Roosevelt: FDR Four Freedom Speech 1941: The Annual Message to Congress. January 6, 1941.

[x]  Nas metamorais tradicionais de Platão, Aristóteles, Spinoza, Hegel, se nota que, supratemporal e absoluto, um mundo espiritual se

realiza em um mundo temporal. Quanto a Durkheim, compartilha ele a crença efetiva, específica aos adeptos da ciência dos costumes e aos sociólogos da vida moral, que afirma a possibilidade desejada de utilizar

a sociologia da vida moral como base de uma doutrina moral, neste caso, uma moral teorética de fundamento sociológico que, ao mesmo tempo, conhecia e estatuía, criando dessa maneira um caminho para nova metamoral, em que a sociologia se colocaria em lugar da filosofia.

[xi] Os valores estudados em sociologia são os valores em obras de civilização que as unidades coletivas atualizam, o que inclui os valores afirmados nas regulamentações sociais pelo direito, pela moralidade pelo conhecimento, pela arte, pela educação, pela religião.

[xii]  Marcando a presença do sociólogo nos antecedentes da UDHR, essa leitura da filosofia social de Bergson foi formalmente proposta por Georges Gurvitch desde New York (EUA) em 1941, e foi republicada em sua obra A Vocação Actual da Sociologia- Vol.II: Antecedentes e Perspectivas, Lisboa, Cosmos, 1986, 567 pp. [1ª ed. en francés: Paris, PUF, 1957], cf. p.234, sq.

[xiii]  Nesse apelo à atuação dos Nós-outros como quadros de referência, a concepção dinâmica de toda a moralidade ultrapassa o indivíduo e as moralidades exclusivamente individualistas.

[xiv]  Essa análise, acoplada à reflexão sobre as liberdades humanas essenciais, destacadas no Preâmbulo da UDHR, toma por base “L’Èvolution Crèatrice” y “Les Données Immédiates de la Conscience”, de Bergson. O aproveitamento dessa leitura aponta para uma concepção dinâmica de toda a moralidade efetiva, como presente nos DDHH. A filosofia social de Bergson, na referência de uma teoria da liberdade na obra “Les Données Immédiates de la Conscience” é oferecida como demonstração da inanidade do determinismo e do indeterminismo clássicos que, orientados para “o que já está feito” e não para “o ato que se faz” ignoram que a liberdade é mais do que um matiz da ação, e que é vivida na própria ação (Cf. Gurvitch: “A Vocação Actual da Sociologia, vol.II”, p.242, op cit.). Nessa teoria, o arbitrário, como a própria opção, é o grau mais baixo da vontade. Para escapar à necessidade de escolher entre as alternativas impostas pela inteligência (conhecedora do progresso), sujeitando a liberdade de ação na ação, Bergson sugere que os graus superiores da vontade, que libertam da sujeição às

alternativas, devem ser verificados no retorno à espontaneidade pura, designada como impulso, que se encontra aquém da consciência, se arriscando, com essa formulação, a identificar a liberdade com o infraconsciente. Nada obstante, Bergson já admite que a liberdade comporta graus, os quais, todavia, só podem manifestar-se em “durações qualitativas diversificadas”. São os graus intermediários da duração e da liberdade, imprescindíveis tanto para a existencia humana quanto para as diferentes ciências, já que, sem essas gradações, tanto a existência quanto as ciências restam condenadas a não poder ir mais além do tempo espacializado, próprio ao domínio exteriorizado do mecanismo newtoniano.  Nota Gurvitch que é em razão dessa teoria da liberdade se exercendo contra as imposições da inteligência que “Bergson descreve os diferentes graus da duração e da liberdade correspondentes ao vital, ao psicológico, ao social e ao espiritual (ver “Matière et Mémoire”, bien como “La Èvolution Crèatrice”). Nessa descrição, a liberdade plena, compreendendo a atividade propriamente criadora, liga-se à vida espiritual; em seguida, vem a vida consciente, que é psicológica e social, a qual conduz à vida espiritual, e é tida como o reservatório da liberdade, quer dizer, uma liberdade muito mais intensa que a simples espontaneidade vital. Eis a série, notando que será em consonância com essa gradação da liberdade que se verifica a gradação dos tempos (espessura da duração).

[xv] Ibid. ibidem. Sabe que o desvio místico de Bergson se debe ao não ter ele encontrado em sua análise da liberdade consciente o problema dos valores em obras de civilização, “eses escalones que dirigen la elevación libertadora” (Gurvitch).

[xvi] O direito de saber – direito à educação, ao conhecimento – é um requisito para a liberdade de pensamento e de consciência; a liberdade de pensamento e a liberdade de expressão surgem como as condições necessárias para a liberdade de acesso à informação.

[xvii] Desde o ponto de vista sociológico, a liberdade é mais do que a variável lógica que altera as proposições teoréticas. É sim liberdade humana, por intervir nos determinismos sociais e precipitar a quebra dos equilíbrios, e, desse modo, viabilizar as mudanças estruturais. Por consequência, nota seu efetivismo. Ver Gurvitch, Georges (1894-1965): “Determinismos Sociais e Liberdade Humana: Em direção ao estudo sociológico dos caminhos da liberdade”, trad. Heribaldo Dias, Rio de Janeiro, Forense, 1968, 361 pp., traduzido da 2ªedição francesa

de 1963, (1ª edição em Francês: Paris, PUF, 1955).

[xviii] Veja o capítulo vinte de seu Tractatus Theologico-Politicus.

[xix] As opiniões coletivas surgem sempre vacilantes e incertas, a iludirem as chamadas pesquisas de opinião.

[xx] Os atos mentais – inclusive as intuições intelectuais e os juízos cognitivos – surgem como as manifestações as mais intensas do consciente que se transcendem elas mesmas na posse, no conhecimento e na participação nos conteúdos reais, experimentados estes últimos, afirmados e moldados como heterogêneos (obstáculos, “incógnitas”) aos atos mesmos, isto é, como heterogêneos às intuições intelectuais e aos juízos; às preferências e às repugnâncias em linhas com os valores, a simpatia, o amor, o ódio; enfim, heterogêneos às opções (escolha entre alternativas), às decisões e às criações.

[xxi] Gurvitch, G. (1894-1965): “A Vocação Actual da Sociologia – vol. II: antecedentes y perspectivas”, (Cf. Tradución en lengua portuguesa de la 3ª edición francesa de 1968, por Orlando Daniel, Lisboa, Cosmos, 1986, 567 pp. [1ª ed. em francés: Paris, PUF, 1957], cit.

[xxii] Dado que a globalização se acelerou na década de 1990, representando uma ameaça para as populações, verificou-se a tendência para a universalização dos direitos humanos, e a maioria dos Estados incorporou em suas constituições muitas disposições dos direitos humanos. Sabem que, das 165 constituições, 122 incluem disposições sobre direitos socioeconômicos (tais como o direito a um trabalho digno, direito à moradia e à seguridade alimentar), 134 adotaram disposições para os direitos das mulheres, 89 adotaram disposições dos direitos de saúde, e 105 têm disposições para os direitos das minorias. Cf. Moncada A. and Blau J. (2006) Human Rights and the Roles of Social Scientists. Societies Without Borders 1 (1): 113-122.

[xxiii] Ver Gurvitch, G. “Determinismos Sociais e Liberdade Humana: Em direção ao estudo sociológico dos caminhos da liberdade”, Rio de Janeiro, Forense, 1968, 361 pp., op cit.

[xxiv] Um exemplo de ceticismo gratuito é o artigo de Slavoj Žižek: “Contra os direitos humanos”, Mediações – Revista de Ciências Sociais, v. 15, n. 1 (2010) http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/mediacoes/article/view/6541/5947-verificado em 26.07.2016)

[xxv] Frezzo, M: “Sociology and Human Rights Education: Beyond the Three Generations?”, Societies Without Borders 6:2 (2011) 3-22.

[xxvi] Ibid, ibidem

Posted in conhecimentos universitários, democracia, derechos humanos, desarrollo, desejável, desejo, desenvolvimento, desigualdades, dialéctica, direitos civis, direitos humanos, direitos políticos, formação, história, história social, history, ideologia, indivíduo, individuação, individualidade concreta, individualismo, integração, intelectuais, liberdade de expressão, liberdade de imprensa, liberdade política, Livros; e-books universitários, mentalidade, metodologia científica, modernização, moralidade, motivação, movimentos sociais, mundo dos valores, mundo moderno, neoliberalismo, Ocidente, ONU, opulência e pobreza, ordem institucional, organismos internacionales, participação, públicos, pesquisa científica, pluralismo, política internacional, políticas públicas, problemas sociológicos, produtivismo, psicologia coletiva, psiquismo coletivo, questões públicas, realidade social, realismo, relações humanas, relações internacionais, representação de interesses, responsabilidade social, século vinte, sociabilidade, sociólogo, sociólogos, Sociólogos sin Fronteras, sociedad, sociedade, sociedade de informação; comunicação social, sociedades globais, sociologia, sociologia do conhecimento, solidariedade, subjetividade coletiva, temas coletivos, teoria sociológica, TICs e Educação, Universal Declaration of Human Rights, valores, variabilidade, vida intelectualTagged atomismo, direitos humanos, história, programa mundial para a educação em direitos humanos WPHRE, questões públicas, solidariedade, Teoria Sociológica, utilitarismoLeave a comment

O Mundo Dos Valores e as Condutas Efervescentes

Posted on April 6, 2017 by Jacob (J.) Lumier

 

Notas sobre o Aspecto Instituinte Da Vida Social.

 

 

Sumário

O Mundo Dos Valores e as Condutas Efervescentes. 1

O Espontaneísmo Social E Coletivo. 2

As Condutas Coletivas Efervescentes. 2

A Função Simbólica. 3

O Caráter Racional Dos Símbolos. 3

O Conflito Imaginado Do Indivíduo E Da Sociedade. 4

A Intervenção Do Sociólogo. 6

A Noção Antidogmática De Mumificação Do Discursivo. 6

 

 

 

Etiquetas:

Comunicação, crítica, história, ideologia, relações humanas, sociologia, século vinte, mundo dos valores, símbolos sociais, estrutura, mudança, fossilizações, estandardização, condutas efervescentes, sociólogo.

 

 

 

Abstract

Fundamental em sociologia, como aporte às ciências humanas, é seu modo especial de estudar o mundo das ideias e valores, como indispensáveis às obras de civilização (moral, direito, conhecimento, educação), e como a camada da realidade social que é posta em perspectiva sociológica.

 

 

 

 

O Espontaneísmo Social E Coletivo

O mundo das ideias e valores provoca a coincidência dos quadros de referências lógicas e de referências estimativas, por um lado, com os quadros sociais, por outro lado. Basta notar que, na prática científica, as dimensões observacionais de qualquer modelo de verificação dos determinismos, por exemplo, sofrem a influência da linguagem seletiva de quem o aplica, com as influências sócio históricas se fazendo sentir por meio dessa linguagem.

Desse modo, diferenciam-se as correlações funcionais entre as ideias e valores que aspiram à validade – notadamente os valores que entram em foco nas dinâmicas espontâneas das avaliações coletivas – e os tipos sociais, em especial os tipos de estruturas sociais. Lembrar, por exemplo, a confiança do homem no humano, como foco irradiador nas correlações observadas nos tipos de sociedades que dão à luz o capitalismo, nos séculos XVII e XVIII, e explicam o Iluminismo.

Um mundo de ideias e valores é descoberto por trás das condutas, das atitudes, dos modelos, dos papéis sociais, inclusive por trás dos símbolos sociais e suas esquematizações cristalizadas em nível dos aparelhos organizados, fato esse que torna indispensável tomar em consideração esse mundo de ideias e valores no estudo das ambiências de relações humanas e sociais.

Tanto mais que essas relações humanas, em sentido ampliado, ultrapassam as suas esquematizações estabelecidas em modelos de êxito e distribuição de vantagens, e cobram consequências nas condutas efervescentes, as quais, diferenciadas na formação de um sentimento coletivo, muitas vezes afloram em reuniões, assembleias, debates, seja no âmbito das empresas e aparelhos organizados, seja em nível de agrupamentos de localidades e demais agrupamentos funcionais [i].

As Condutas Coletivas Efervescentes

Para o sociólogo não há criação de um simbolismo novo sem a afirmação de ideias e valores que dão a motivação e, mais que isto, geram a inspiração para as condutas coletivas efervescentes, iluminando-as para que favoreçam a reestruturação; tornando-as forças luminosas e não “correntes cegas”, contrariando os que resistem à mudança pelo espontaneísmo social e coletivo.

Nota que essas condutas efervescentes, quando afirmadas pelos Nós-outros das comunhões ativas ou ativistas (como o são as diversas seitas ou grupos sectários de diversas filiações religiosos, culturais, políticos, espiritualistas, pacifistas, naturalistas, ecologistas, naturistas, preservacionistas, humanistas, filantrópicos, socialistas, comunitaristas, etc.),  manifestam a sua independência em relação aos símbolos, afastando-os, destruindo-os, substituindo-os por criações novas (notadamente em conjunturas ou situações de transição, seja em escala global ou no interior de grupos e de classes sociais), e isto geralmente sendo afirmado contra os aparelhos organizados.

Desta sorte, cabe ao sociólogo examinar as significações práticas encaradas, vividas ou desejadas pelos sujeitos – quer tais significações impliquem comportamentos, gestos, modelos, papéis sociais ou atitudes coletivas – para solucionar a questão do que exatamente as exteriorizações ou manifestações coletivas recobrem.  E só se chega a essa resolução mediante a interpretação das ideias e valores ali implicados, quer dizer, pela aplicação das correlações funcionais que caracterizam a existência do mundo das ideias e valores na realidade social – por via das quais, enfim, se alcança o psiquismo coletivo, o plano dos atos e estados mentais, o nível das dinâmicas espontâneas das avaliações coletivas, das opiniões, carências, satisfações, esforços, sofrimentos e ideais.

 

A Função Simbólica

Em sociologia não é necessário que todos os símbolos sejam generalizados e estandardizados; não é necessário que estejam ligados a modelos mais ou menos cristalizados ou fixados de antemão: há um simbolismo singular e espontâneo que em circunstâncias particulares pode tornar-se importante, e que está próximo das condutas coletivas efervescentes, inovadoras e criadoras, tanto quanto vem a ser afirmado em relação ao plano das ideias e dos valores, simbolismo espontâneo que está igualmente próximo da apreensão coletiva direta, não mediatizada pelos símbolos sociais [ii].

Quer dizer esse simbolismo espontâneo e inteiramente singular está na proximidade dos atos mentais coletivos, incluindo as intuições intelectuais, emotivas, voluntárias, as quais são vividas ou experimentadas pelos Nós-outros, grupos, sociedades globais, por via das quais, como sabe, o plano dos valores e ideias revela-se eficaz.

O Caráter Racional Dos Símbolos

Os símbolos são presenças intencionalmente introduzidas e invocadas para indicar carências, tornando de tal sorte reconhecida a “expressão-signo no símbolo”. Aliás, é a essa expressão-signo que se refere o aspecto de inadequação, que a função simbólica compartilha com o seu sentido de instrumento de participação ou de impulso para a participação direta no significado [iii].     

    Cabe lembrar que ao constatar o signo no símbolo não se exagera sobre o conhecimento de que a maior parte dos símbolos adquiriu por etapas nos tipos mais recentes de sociedade um caráter completamente racional, não tendo mais o aspecto místico original da esfera simbólica (originariamente a esfera simbólica surge ligada às crenças no sobrenatural, religioso ou não.).

Vale dizer, a sociologia não tira do fato desse caráter racional, adquirido através dos tipos de sociedade, a conclusão de que os símbolos se tornaram simples signos, simples indicativos da ação ou do comportamento: a sociologia repele nessa hipótese exagerada da preponderância total dos signos [iv] a consequente  redução na intensidade do caráter de instrumento impulsionando para a participação direta no significado, caráter próprio aos símbolos.

Lembra que, em sociologia, a autonomia do significado é relativa e só se afirma na dependência ao fenômeno social total, de tal sorte que o avanço na racionalidade tem igualmente seu critério nessa dependência.

Nota que a referida participação direta no significado pode ela própria tomar um caráter racional e natural e não levar os símbolos em modo algum a se tornarem veículos de misticidade [v].

Tomando o exemplo de uma investigação científica em equipe onde prevalece o apelo à descoberta, nota-se que a participação consciente em diferentes níveis no ser social, ou na criação coletiva intelectual, não inclui o elemento místico.

O Conflito Imaginado Do Indivíduo E Da Sociedade

A análise sociológica passa em crítica certos procedimentos habituais da psicologia social do século XX que são aplicados em maneira geral. Como é sabido, frequentemente se considera a vida psíquica do ser humano a partir da expressão exterior, dos aspectos físicos e materiais que o indivíduo e a sociedade ambos apresentam. Sem dúvida, essa expressão exterior alcança o indivíduo.

Não há negar o fato de que os indivíduos e as sociedades estão sob o domínio dos hábitos, do costume, dos ritos, das práticas, dos modelos, dos símbolos estandardizados e que essa expressão exterior constitui uma espécie de crosta da sua atividade, mais ou menos arrefecida e tornada rígida.

Nada obstante, deve-se advertir, igualmente, ser fato que indivíduo e sociedade, tanto um quanto o outro podem entrar em efervescência, penetrar através dessa carapaça mais ou menos rígida, agir, lançar-se em condutas inovadoras e criadoras.

    Em realismo sociológico, o indivíduo e a sociedade são analisados no mesmo plano de tal sorte que a suposta oposição de um ao outro revela-se um conflito imaginado, e se reduz a uma tensão entre os níveis em profundidade, neste caso, mostrando uma tensão entre os modelos do individual e os modelos do coletivo, incluindo a tensão entre os modelos estandardizados e as condutas efervescentes, a qual é observada tanto na vida social quanto na vida individual.

É a montagem dos conflitos do indivíduo e da sociedade, o procedimento adotado quando o psicólogo social toma por ponto de partida não o desestruturante, mas o aspecto estruturante da sociedade, o aspecto do costume, dos ritos, das práticas e dos modelos e inadvertidamente, tomando-os em seu conjunto como outro, lhes contrapõe o indivíduo, considerado em uma conduta de efervescência criadora, isto é, o indivíduo que inova, que inventa, que cria.

Sem embargo, à margem dessa montagem a contemplar imaginativamente uma oposição inexistente entre diferentes níveis em profundidade da realidade social, a análise em realismo sociológico põe em relevo o fato de o indivíduo poder estar em paralelismo com a sociedade, aquém de qualquer conflito que os oponha um ao outro.

Quer dizer, considerado no mesmo plano, o indivíduo pode estar por seu lado tão submetido às suas próprias obras, às suas próprias práticas, aos seus próprios modelos e símbolos cristalizados (os modelos de conduta individual), quanto a sociedade pode estar submetida aos seus (os modelos de conduta coletiva).

Por consequência, diante da constatação de um paralelismo, o suposto conflito do indivíduo e da sociedade ou a oposição de um e de outro revela-se um conflito imaginado, o qual, em realidade, sendo adotado o procedimento metodológico adequado de confrontá-los no mesmo plano, se reduz a uma tensão entre os níveis em profundidade, neste caso mostrando uma tensão entre os modelos do individual e os modelos do coletivo, incluindo a tensão entre os modelos estandardizados e as condutas efervescentes, tensão esta observada tanto na vida social quanto na vida individual.

Tendo em conta que a tecnificação dos controles sociais levando a um mundo administrado é intensificada nos ambientes de cultura de massas, o sociólogo reconhece a validade dos estudos da estandardização característica dessas ambiências, sendo a considerar o interesse sociológico da crítica da cultura ao investigar através da estandardização os vários aspectos da desmitologização, ligados ao mundo da comunicação social. Tanto mais porque o sociólogo constata a improbabilidade de uma noção tecnológica do conhecimento como separado das mitologias sociais.

Um dos principais postulados da crítica da cultura afirma a destruição da identidade da experiência do sujeito, de tal sorte que, em uma relação de comunicação social, torna-se bloqueado o quid especial e particular que o narrar significa.

Tal a situação crítica acentuada no século XX: as peripécias e as aventuras se generalizaram, já são conhecidas. A impossibilidade em narrar algo individual é atribuída por T. W. Adorno [vi] ao fenômeno da estandardização, o Sempre Igual da produção em massa, como marca do mundo administrado em que se impõe a relação de comunicação social [vii].

A Intervenção Do Sociólogo

Seja como for, deve-se reter que a teoria sociológica é elaborada com o recurso da dialética[viii] para a intervenção do sociólogo e demais profissionais das ciências humanas que em suas atividades sociais regulares se relacionam ao aspecto instituinte da vida social, como as condutas efervescentes que muitas vezes emergem nos diálogos, debates, reuniões, assembleias, etc.

A existência dos conflitos reais entre os aparelhos organizados, as estruturas propriamente ditas e, enfim, a vida espontânea dos grupos desenvolveu a percepção sociológica que relativiza os controles sociais.

Vale dizer, não se pode preservar o conceito de instituição como práxis e coisa, como maneiras de ser e jeitos objetivados de se ver e aí desconhecer a dialética: os atos individuais ou coletivos não se deixam reduzir à objetivação nos conteúdos ou obras de civilização – o direito, a moral e o conhecimento variam em função dos quadros sociais.

E, mais do que as mudanças estruturadas, são exatamente as variações na realidade social que o sociólogo busca e a sociologia explica.

Na mirada pró-atuação, nossa disciplina põe em relevo as linhas de intervenção positiva para o reconhecimento do individual e para o enriquecimento da vida social dos grupos, pela descoberta da realidade social.

A Noção Antidogmática De Mumificação Do Discursivo

Neste sentido sobressai o aproveitamento da noção antidogmática de mumificação do discursivo [ix] que inclui a “interiorização das normas” como obstáculo à capacidade instituinte, tornando problemático o termo instituição, deste ponto de vista considerado demasiado estreito.  Além disso, autores igualmente praticantes da mirada desdogmatizadora adotaram a recusa da aplicação sociológica de “instituição“, como termo cristalizado que se limita a designar o instituído, a coisa estabelecida, as normas já presentes, o estado de fato confundido ao estado de direito, tornando desse modo cada vez mais escondido o aspecto instituinte da vida social [x].

É claro que se trata de aprofundar nas “fossilizações sociais”, já constatadas nas análises de Saint-Simon, e, a partir dele, constituem, através da noção gurvitchiana de mumificação do discursivo, um conceito sociológico abrangendo a psicologia coletiva na sociologia, tendo serventia para verificar justamente os obstáculos à percepção das transformações no interior das estruturas.

Como se sabe, na Phyisiologie Sociale há um trecho definindo as fossilizações sociais como obstáculos ao progresso social e bloqueios à percepção da própria mudança que a atitude afinada com as mudanças deve conhecer não tanto como o seu contrário, mas como seu desafio. No dizer de Saint-Simon, trata-se daqueles entraves observados em um estado coletivo de melancolia e depauperação que conduz ao desaparecimento da vida social à medida que (a) – inibe de resolver-se por um regime ativo, e (b) – corresponde a uma atitude de repugnância à mudança consentindo em grandes sacrifícios para preservar as coisas tais quais são e as fixar em maneira invariável no ponto onde elas se encontram.

Saint-Simon se refere a tal estado como uma corrente de opinião estacionária, melhor, estagnada, de natureza puramente passiva, e nostálgica de uma forma de governo equiparável àquelas que duraram tantos séculos sem experimentar nenhum estremecimento geral, como houvera durado o “Ancien Régime”.

Segundo Saint-Simon, tal estado de fossilização sendo referido ao Ancien Régime se mostra sempre pronto a reter e fixar o que é sobrevindo, para perpetuar o que existe, impelindo à vigília de um esforço inútil os que têm afinidade com as mudanças [xi].

Desta forma, nas fossilizações sociais somam-se as cristalizações dos modelos e a dogmatização das normas que os reforçam. Daí a importância da desdogmatização do saber para o sociólogo em sua busca das variações na realidade social.

Nada obstante, vê-se igualmente que a compreensão do progresso social como horizonte da sociologia inscreve-se na reflexão de Saint-Simon caracterizando-a como pesquisa dos obstáculos à modernização, de tal sorte que não somente seria válido admitir uma atuação ou intervenção do sociólogo, mas o iniciante em nossa disciplina poderia sentir-se estimulado a sugestionar-se que a intervenção do sociólogo visa acelerar o progresso das mudanças.

Essa inferência seria justa se o obstáculo assinalado nas fossilizações sociais fosse predominantemente de ordem da morfologia social ao invés de revelar-se em meio à trama do organizado e do espontâneo.

Menos destoante seria a sugestão de que o sociólogo busca ultrapassar o conformismo, haja vista em Saint-Simon a repugnância à mudança como a atitude que melhor corresponde às fossilizações sociais.

Na verdade, indo ao fundo da modernização, o que Saint-Simon investiga nas fossilizações sociais e que posteriormente veio a ser designado por mumificação do discursivo são os obstáculos à permanência da vida social em mudança permanente. Sendo sociólogo, visou esclarecer, nesse seu escrito publicado, uma situação penetrada por certo estado coletivo estacionário, estagnado, passivo, a colocar em risco o fluxo da sociabilidade e, por isso, apreendido como obstáculo.

Portanto, só é legitimo falar de intervenção do sociólogo unicamente em consideração de sua atividade intelectual docente, como publicista, orientador ou aconselhador, posto que, com sua mirada treinada para não sublimar os obstáculos à percepção da realidade social, o sociólogo intervém para esclarecer e desanuviar as situações complexas em meio à trama e tensão do plano organizado e do espontaneísmo social, inclusive em escala microssocial e no âmbito dos agrupamentos sociais particulares.

 

***

Notas

 

[i] Há seis espécies de agrupamentos funcionais, seguinte:    (1)- os agrupamentos de parentesco : clã, família doméstica, família conjugal, lar, etc.;  (2)- os agrupamentos de afinidade fraternal , que são fundados sobre uma afinidade de situação, compreendida aí a situação econômica, mas que também podem ser fundados sobre uma afinidade de crença, de gosto ou de interesse: por exemplo: os agrupamentos de idade e de sexo , os diferentes públicos, os agrupamentos de pessoas tendo os mesmos rendimentos ou fortunas;  (3)- os agrupamentos de localidade : comunas ou comarcas, municipalidades, departamentos, distritos, regiões, Estados;    (4)- os agrupamentos de atividade econômica, compreendendo todos os agrupamentos  cujas principais funções consistem em participação na produção, nas trocas, na distribuição ou na organização do consumo;   (5)- os agrupamentos de atividade não-lucrativa, como os partidos políticos, as sociedades eruditas ou filantrópicas, clubes esportivos, etc.;   (6)- os agrupamentos místico-extáticos , como as igrejas, congregações, ordens religiosas, seitas, confrarias arcaicas, etc.

A escala dos agrupamentos funcionais, cujas espécies acabamos de enumerar, é posta em relevo como sendo privilegiada e formando os pilares das sociedades.  Constituem não só o pilar das sociedades globais de todo o tipo, mas também o de toda a estrutura social do conjunto.  Todavia, é do fato de que os agrupamentos mudam de caráter em função dos tipos de sociedades globais em que se integram, como já o dissemos, que se pode falar de tipos de agrupamentos, e de que estes tipos são mais concretos que os tipos microssociológicos, são mais concretos do que a Massa, a Comunidade, a Comunhão, as relações de aproximação, as relações de afastamento, as relações mistas.   Quer dizer, os tipos de agrupamentos são mais submetidos às condições históricas e geográficas; são mais dependentes dos tipos de estruturas globais em foco na estrutura social do conjunto, em que ora formam blocos maciços, ora se dispersam, sofrendo de maneira manifesta os efeitos do modo de operar da sociedade global.

 

[ii] Exemplos desse simbolismo propriamente social são afirmados em correntes espontâneas religiosas, culturais, políticas, espiritualistas, pacifistas, naturalistas, ecologistas, naturistas, preservacionistas, humanistas, filantrópicos, socialistas, comunitaristas, etc. A capacidade eventualmente atribuída aos meios de comunicação, em poucos casos, em criar públicos específicos, que são agrupamentos sociais particulares a distância, e não restar simplesmente como reflexos de quadros sociais com demandas previamente fixadas, deve ser referida à existência do simbolismo propriamente social e suas correntes espontâneas.

[iii] Ver capítulo sobre os símbolos sociais em: Gurvitch et al.: “Tratado de Sociologia-vol. 1“, op.cit.

[iv] Nessa hipótese exagerada acredita-se que os sistemas simbólicos “engendram o sentido e o consenso em torno do sentido” por meio de alguma lógica, e se deixa de lado a pesquisa sociológica fundamental do sentido da esfera simbólica ela própria, como setor da realidade social.

[v] Já notamos esta característica racional quando Cassirer liga o progresso da cultura à diferenciação entre coisas e símbolos, com a distinção entre realidade e possibilidade tornando-se mais pronunciada.

[vi] Adorno, Theodor W.: Notas de Literatura, tradução de Manuel Sacristán, Barcelona, Ed. Ariel, 1962, 134 pp.

[vii] A sociologia da literatura fornece amplo material sobre a problemática psicossociológica da tensão entre o estandardizado e o espontâneo no mundo da comunicação social ao século XX. Ver: Lumier, Jacob (J.): A Utopia Negativa, Madrid, Bubok, 2010, 148 págs.  http://www.bubok.es/libros/210606/A-Utopia-Negativa2-edicao-modificada

[viii] Ver artigo anterior sobre a dialética dos conjuntos em sociologia.

[ix] Ver: Gurvitch, Georges (1894-1965): “Dialectique et Sociologie”, Flammarion, Paris 1962, 312 pp., Col. Science. Op. cit.

[x] Ver: Lourau, René: ‘A Análise institucional’, tradução Mariano Ferreira, Petrópolis, editora Vozes, 1975, 296 pp. (1ª ed. em Francês: Paris, ed. De Minuit, 1970). Ver: Gabel, Joseph: “Sociología de la Alienación”, trad. Noemi Labrune, Buenos Aires, Amorrortu , 1973, 225 pp. (1ª edição em Francês, Paris, PUF, 1970)

[xi] Ver “La Physiologie Sociale, págs. 53/55. http://classiques.uqac.ca/clasiues/saint_simon_Claude_henri/physiologie_sociale/physiologie_sociale.html

 

 

Posted in aspiração aos valores, comunicação social, conhecimentos universitários, desenvolvimento, formação, grupos sociais, Gurvitch, indivíduo, mentalidade, metodologia científica, microssociologia, modernização, motivação, mundo dos valores, problemas sociológicos, psicologia coletiva, realidade social, realismo, relações humanas, representação de interesses, responsabilidade social, sentimento coletivo, sociabilidade, sociólogo, sociedade, sociologia, standardização, teoria sociológica, Uncategorized, valores, variabilidadeTagged ensino-de-sociologia, experiência, mundo dos valores, símbolos sociais, sociologia, Teoria SociológicaLeave a comment

Artigos de Jacob (J.) Lumier publicados no Observatório da Imprensa

Posted on November 7, 2013 by Jacob (J.) Lumier

 

 Jacob (J.) Lumier Autor JLumier2012Ano Observatório da Imprensa
Veja o índice completo dos artigos diretamente no Observatório da Imprensa
tecle aqui
***
Caderno Da Cidadania> Democracia Eleitoral
Notas críticas ao regime de voto obrigatório
Por Jacob (J.) Lumier em 16/06/2015 na edição 855
A grande imprensa e o jornalismo premiado da televisão, como o Jornal
 Nacional, pouco ou quase nada comentaram o fato de que, há poucos dias,
 a Reforma Política manteve o voto obrigatório.
Há um esquecimento das implicações internacionais dessa matéria.

Acesse o artigo completo

MÉXICO
Atentado brutal contra ativistas e jornalistas
Caderno da Cidadania | 04/05/2010 | Edição 588 | Por Jacob (J.) Lumier | 0 comentários
O fato do vazamento de óleo alcançando os Estados Unidos não deixa esquecer que o respeito dos direitos humanos no México torna-se cada vez mais exigido, tanto que a imprensa internacional (ver este link do Google) reagiu prontamente ao atentado denunciado pelo organismo da ONU. Com efeito, a Oficina en México del Alto Comisionado de las Naciones Unidas para los Derechos Humanos (OACNUDH) tom…
» leia mais
MÍDIA & DEMOCRACIA
A identificação participativa dos eleitores
Caderno da Cidadania | 22/09/2009 | Edição 556 | Por Jacob (J.) Lumier | 0 comentários
Há dualidade no estudo dos eleitores. Por um lado, em nível jurídico-político, os eleitores são compreendidos em relação ao sistema de representação e o mais usual é tratá-los em maneira restrita: simples função de certo modelo de representação.Todavia, a condição de que os votantes são cidadãos, portanto ligados ao compromisso com a sustentabilidade de um regime democrático, p…
» leia mais
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
A marcha pelo emprego, a mídia e os direitos humanos
Caderno da Cidadania | 15/09/2009 | Edição 555 | Por Jacob (J.) Lumier | 0 comentários
Pelo que parece, a ação social do presidente Obama pela defesa de um modelo público dos planos de saúde é tão brilhante que o mês de agosto terminou e ofuscada restou a importância para os direitos humanos da March for Jobs and Freedom, de 28 de agosto de 1963, então com grande repercussão nos meios de comunicação.A orientação dos direitos humanos para a compreensão de que as pessoa…
» leia mais
MÍDIA & ELEIÇÕES
O imbróglio do voto obrigatório
Caderno da Cidadania | 25/08/2009 | Edição 552 | Por Jacob (J.) Lumier | 0 comentários
Em face da rejeição da PEC nº 28, de 2008, que altera o Art. 14 da Constituição Federal, para tornar o voto facultativo (ver aqui) caberia insistir em possível reapresentação da Proposta, tendo em conta o silêncio sobre os fundamentos do voto facultativo no Article 21 da Universal Declaration of Human Rights-UDHR (ver aqui).Essa questão tem enquadre nas Convenções Internacionais compro…
» leia mais
MÍDIA & DEMOCRACIA
A ficção nas eleições
Caderno da Cidadania | 28/07/2009 | Edição 548 | Por Jacob (J.) Lumier | 0 comentários
Melhor do que a imagem do círculo vicioso, a mensagem do Pequeno Príncipe, de Saint-Exupéry, às voltas com a virtude do redondo – chega-se pela direita ao mesmo lugar de onde se partiu caminhando reto em direção oposta, e vice-versa – tem préstimo para exemplificar a especialização da política, tal como explicada por Max Weber.Embora polemizada por seu ponto de vista externo e cultur…
» leia mais

 

CIBERESPAÇO & GEOPOLÍTICA
Um website-demonstração de solidariedade
E-Notícias | 01/09/2009 | Edição 553 | Por Jacob (J.) Lumier | 0 comentários
Quando se fala de ciberactivismo, lembramos logo de organizações exemplares em mobilizar pelo correio, como Anistia Internacional ou Greenpeace, que desde sempre mostraram o caminho para ações sociais eficazes à distância, revalorizando o exercício da cidadania para a democracia em escala das sociedades globais.Mas a internet é dinâmica ao extremo e promove a variabilidade ao infinito, de…
» leia mais

 

RESCALDO DAS URNAS
Voto obrigatório e hegemonia burguesa
Feitos & Desfeitas | 23/11/2010 | Edição 617 | Por Jacob (L.) Lumier | 1 comentários
Article 25 International Covenant on Civil and Political Rights: “Every citizen shall have the right and the opportunity, without any of the distinctions mentioned in article 2 and without unreasonable restrictions: (…) b) To vote and to be elected at genuine periodic elections which shall be by universal and equal suffrage and shall be held by secret ballot, guaranteeing the free expression of …
» leia mais
PARLAMENTO EUROPEU
Proposta de um observatório para o pluralismo das mídias
Feitos & Desfeitas | 12/10/2009 | Edição 559 | Por Jacob (J.) Lumier | 0 comentários
Em perspectiva de ação, compreendendo a livre expressão em nível de preceito jurídico com realidade social, a cidadania efetua-se como aspiração aos valores. Sem a liberdade de expressão restaria letra vazia, imposição de garantia formal, contradição. É essa vontade democrática que, em numeroso coletivo desde o dia 3 de outubro, vem se erguendo em face do quase monopólio sobre as m�…
» leia mais
MÍDIA & SOCIEDADE
Estatus e expectativas de cidadania
Feitos & Desfeitas | 29/09/2009 | Edição 557 | Por Jacob (J.) Lumier | 0 comentários
A insuficiência na compreensão da cidadania deve-se ao hábito de definir esse termo em um esquema de análise prévio como, por exemplo, o estatus, as práticas e as instituições. Desta forma, aceitam-se reduzir as expectativas de cidadania ao nível mental, representações que os indivíduos projetam quando perguntados sobre o que esperam de tal ou qual medida social.Frequentemente prevalec…
» leia mais
DIREITOS HUMANOS & ELEIÇÕES
O voto facultativo e o Artigo 21
Interesse Público | 18/08/2009 | Edição 551 | Por Jacob (J.) Lumier | 2 comentários
Como se sabe, é inconsequente refletir sobre os Direitos Humanos sem levar em conta a ambivalência introduzida pela lógica do fazer lucros nas sociedades democráticas com maior experiência da solidariedade e da luta coletiva. Admite-se em face dessa ambivalência que o simples fato de promulgar já garante os Direitos Humanos – direitos à liberdade, à autodeterminação, econômicos e de …
» leia mais
DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO
Caráter reticente e vontade política
Interesse Público | 14/07/2009 | Edição 546 | Por Jacob (J.) Lumier | 1 comentários
Em recente entrevista divulgada neste Observatório da Imprensa (ver aqui), a deputada Luiza Erundina deixou claro que um obstáculo à democratização dos meios de comunicação é a falta de avanço, o silêncio lançado contra a PEC disciplinadora, que proíbe expressamente parlamentares de serem donos de empresas de radiodifusão.Não que a reticência sobre a proibição assim projetada indi…
» leia mais
DESIGUALDADES SOCIAIS
Dois pesos e duas medidas
Jornal de Debates | 09/03/2010 | Edição 580 | Por Jacob (J.) Lumier | 2 comentários
A mídia conservadora tem dois pesos e duas medidas em relação às desigualdades sociais. Quando o assunto é noticiar sobre as camadas subalternas sofridas, que aceitam conformados as soluções que vêm de cima, o espaço de imagens, comentários e até reportagens em programas rurais é bem maior do que a informação reservada aos menos submissos, que soltam a voz da cidadania e protestam em…
» leia mais
COMUNICAÇÃO & SOCIOLOGIA
Notas sobre a criação de identidades particulares
Mosaico | 06/10/2009 | Edição 558 | Por Jacob (J.) Lumier | 0 comentários
A constatação da ambiguidade do romance tornado técnica de comunicação levou o sociólogo crítico da cultura a uma reflexão sobre a situação do gênero romanesco em face da realidade no momento antirrealista do romance, ao século vinte, a partir de uma cultura histórica difusa, vaga, sem pertença, uma cultura que não se individualiza sobre a qual se observa a extensão do mundo da com…
» leia mais
-22.903539 -43.209587
Posted in ação global, crítica da cultura, democracia, derechos humanos, desarrollo, desenvolvimento, desigualdade, dialética, direito, direitos civis, direitos humanos, Direitos Humanos, direitos políticos, direitos sociais, ecologia política, economia-solidária, educação, Eleições, eleitores, elitismo, ensaios críticos, Estudo Crítico; Sociologia., formação, globalização, grupos sociais, história social, history, homo faber, indivíduo, individuação, integração, intelectuais, internet, Internet; conhecimentos universitários, jornalismo, jornalistas, leitura, leituras, liberdade, liberdade de expressão, liberdade de imprensa, liberdade de voto, liberdade política, liberdades, literatura, mídia, mídias, mentalidade, metodologia científica, microssociologia, modernização, moralidade, motivação, movimentos sociais, mundo dos valores, mundo moderno, neoliberalismo, Notícias e política, Noticias y política, obras, ONGs, ONU, opulência e pobreza, ordem institucional, organismos internacionales, organizações internacionais, organizações produtivas, países del Sur global, Parlamento-Europeu, participação, pesquisa científica, pluralismo, políticas públicas, povos, problemas sociológicos, produtivismo, psiquismo coletivo, questões públicas, realidade social, reforma do capitalismo, relações humanas, relações internacionais, relativismo científico, representação de interesses, responsabilidade social, século vinte, sentimento coletivo, sociabilidade, sociólogo, Sociólogos sin Fronteras, sociedade, sociedade de informação; comunicação social, sociedade industrial, sociedades globais, sociologia, sociologia do conhecimento, sociologists, sociology, solidariedad, solidariedade, técnica, tecnificação, tecnoburocracia, tecnologia, temas coletivos, teoria de coação, teoria sociológica, União Européia, Universal Declaration of Human Rights, utilitarismo, utopia, variabilidade, vida intelectual, votoTagged cidadania, comentários críticos, Derechos Humanos1 Comment

Posts navigation

← Older posts

Archives

leiturasociologica

Categories

Search

Reação contra a xenofobia e o racismo https://t.co/kWAZp4A2fk

— ObservatórioImprensa (@observatorio) 26 de marzo de 2017

Enter your email address to follow this blog and receive notifications of new posts by email.

Join 186 other followers

Blog Stats

  • 25,345 hits

Recent Posts

  • Os Modos De Trabalho E O Objeto Da Sociologia
  • Entre República e Monarquia: A Democracia Eleitoral no Brasil 2 ed. – Ensaio de Sociologia do voto obrigatório.
  • La legislación debe incorporar los derechos y libertades estipulados en los tratados de derechos humanos.
  • Informe anual del HCHR
  • US urged to protect rights defenders as activist Maru Mora Villalpando faces deportation case

Favoritos

  • Contribución para el enseño interdisciplinar de los derechos humanos. Vídeo: Sociólogos sin Fronteras Rio de Janeiro – SSF/RIO quiere marcar su participación en el día internacional de los derechos humanos de 2015 con una reflexión, y con la lectura del texto introductorio del taller de Sociología Y Derechos Humanos
  • Human Rights Day
  • SSF/RIO Fórum de Sociologia Página para debates de Sociólogos sin Fronteras Rio de Janeiro
  • Subjetividad Colectiva y Dialectica El problema de la subjetividad colectiva como incluyendo las creencias colectivas es referenciado de manera específica en la comprensión sociológica del mundo de los valores y no debe ser confundido con el psiquismo colectivo, al cual es conectado.
  • The Development Café

Vídeo: Primeiro ano de expressão de sociólogos sem fronteiras Rio de Janeiro SSF_RIO

O autor Jacob (J.) Lumier em SSF/RIO
O autor Jacob (J.) Lumier em SSF/RIO-2013

Follow me on Twitter

My Tweets

Spam Blocked

1,095 spam blocked by Akismet
A WordPress.com Website.
  • Facebook
  • LinkedIn
  • Twitter
Cancel
Privacy & Cookies: This site uses cookies. By continuing to use this website, you agree to their use.
To find out more, including how to control cookies, see here: Cookie Policy